terça-feira, 17 de junho de 2008

Crónicas de Itália - III

Leonardo da Vinci
Cenacolo, 1495-1497
tempera sobre estuque, 460 x 880 cm
Milano, Santa Maria delle Grazie




Certamente já registaram a sensação de observarem um quadro, de verem um filme, ou de lerem um livro, em que a expectativa do prazer tirado por esse desfrute foi em muito superada pela realidade. Pois bem, foi essa a sensação que senti nos quinze escassos minutos em que me deixaram dialogar com a Última Ceia, pintada, há já quinhentos anos, por Leonardo da Vinci.
A passagem por Milão foi programada para ver o Cenacolo. Embora a oferta cultural de Milão seja grande (tanto em arte, como em música), esta viagem tinha um local eleito: o refeitório do Convento Dominicano de Santa Maria delle Grazie, que nas passagens anteriores nunca tinha conseguido observar (ou por ter estado em restauro, ou por os bilhetes de entrada estarem sempre, sempre, esgotados). [Um amigo ensinou-me um truque, cuja dica deixo aqui: inscrição, com antecedência, numa das empresas que organiza excursões à cidade, que inclua a visita].
A visita ao refettorio é realizada ao cronómetro. Vai-se passando (em grupos de 25 pessoas) de espaço de espera, em espaço de espera, cujas portas são controladas electronicamente, com a mesma segurança que se regista para chegar aos cofres de um grande Banco. Finalmente entramos no Sancto Sanctorum e ficamos literalmente esmagados pela obra de Leonardo, que de imediato entra em diálogo connosco.

Cada personagem, cada gesto, cada pormenor, é de uma intensidade inarrável que nos prende e nos deixa totalmente absorvidos. [Observe-se o diálogo da mão direita de Jesus com a mão esquerda de Judas no momento (?) em que este escuta João a transmitir “o segredo” a Pedro, sobre quem é o traidor; todos os outros protestam a sua inocência];

Não sobra (ou quase não sobra) tempo para ver a grande pintura de Giovanni Donato Montorfano (1440-1510) que teve o azar de realizar a magnífica Crocifissione (1495) na parede oposta ao Cenacolo.




[Facto curioso, a porta de entrada no refeitório situa-se na parede lateral, sensivelmente a meio da sala... e todos os 25 visitantes se viraram e dirigiram para a direita, atraídos por Leonardo, esquecendo Montorfano]

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