segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Agamben - Ideia da Prosa : 2

Ideia do silêncio

Numa recolha de fábulas dos fins da Antiguidade lê-se este apólogo:
" Os Atenienses tinham por hábito chicotear a rigor todo o candidato a filósofo, e , se ele suportasse pacientemente a flagelação, poderia então ser considerado filósofo. Um dia, um dos que se tinham submetido a esta prova exclamou, depois de ter suportado os golpes em silêncio:
« Agora já sou digno de ser considerado filósofo! » Mas responderam-lhe, e com razão:« Tê-lo-ias sido, se tivesses ficado calado» . "
A fábula ensina-nos que a filosofia tem certamente a ver com a experiência do silêncio, mas que o assumir dessa experiência não constitui de modo nenhum a identidade da filosofia. Esta está exposta no silêncio, absolutamente sem identidade, suporta o sem-nome sem encontrar nisto um nome para si própria. O silêncio não é a sua palavra secreta- pelo contrário, a sua palavra cala perfeitamente o próprio silêncio.

- Giorgio Agamben, Ideia da Prosa, Trad.,pref. e notas de João Barrento, Cotovia, 1999.

4 comentários:

  1. Adoro esta sua rubrica.
    "A filosofia tem certamente a ver com a experiência do silêncio...".

    Vou pensar nisto. Começo a gostar deste Agamben. Vou ter que o procurar nas livrarias.

    Da fábula...Era um bocadinho dura a prova por que tinham que passar os filósofos atenienses!
    A.R.

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  2. Parei um bocadinho para pensar. Agamben está a mexer comigo. Ainda não percebi bem qual é o jogo deste filósofo. Vou expor as minhas conclusões e dúvidas.

    1.Se a filosofia é a experiência do silêncio, ela existe por si mesmo sem precisar de interacções. Será?
    2. O "assumir dessa experiência (silêncio) não constitui de modo nenhum a identidade da filosofia" -o que quererá dizer com isto? Será que quem assumir esse silêncio não descobre necessariamente a identidade da Filosofia?
    Este filósofo baralha-me.
    3. Parece-me que há um jogo de palavras, um malabarismo da escrita. Qual é a linguagem da sua filosofia? A filosofia per si não ganha sustentabilidade, ela precisa do homem, do agente que descodifique, não através do silêncio mas através do diálogo que apresente questões para serem resolvidas.
    4. Qual é o objectivo deste filósofo? Qual é a lógica de Agamben?
    5."O silêncio não é a sua palavra secreta- pelo contrário, a sua palavra cala perfeitamente o próprio silêncio". Então em que é que ficamos no silêncio ou no diálogo, uso da palavra?
    Este seu post anda a intrigar-me.

    A.R.

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  3. Esse é precisamente o papel da Filosofia- mais do que dar respostas, é fazer perguntas.
    O silêncio é essencial ao pensamento, embora a Filosofia não se identifique nem se esgote no silêncio. Até porque, como refere, a linguagem é o outro reverso...

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  4. Minha cara A.R., quanto à fábula ateniense, gostava de a ver aplicada aos candidatos a políticos profissionais...

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