sábado, 13 de dezembro de 2008

Satie e os «trepadores»


Satie. Óleo de Suzanne Valadon.

TREPAR?

Os «trepadores» estão longe de me ser antipáticos. Têm um sentido do movimento que, de forma alguma, me desagrada. Apenas o objectivo que desejam atingir me dá que pensar e me inquieta (aliás, pouco). Sim...
Não faço mais do que interrogar-me com precaução, e dizer: - Mas até onde querem eles trepar?... Trepar a quê?... A que horas?... Em que sítio?... Depois, desconfio e sinto-me preocupado por sua causa.
Pelo que me diz respeito, nunca fui trepador nem espero vir a sê-lo. No entanto, compreendo perfeitamente que outros desejem entregar-se a este exercício singular, apesar de tudo amorfo e de certeza incomodativo (para eles).
... Sim... Porque ando a ver trepadores desde há 40 anos, os do meu tempo já tão «espertalhaços» como os do tempo presente.
E todos eles - pois bem! - todos eles, não sei se me entendem, «treparam»... a nada, e até a menos do que nada.
Isto apesar de alguns terem «trepado» em várias academias e noutros lugares... de má nota... Sim.
É que «trepar» significaria, quando o espírito é honesto, o espírito é recto, tender para uma melhoria, conseguir um aumento (mas não de peso, como é evidente).
Vejo, porém, que para outros - ai de mim! - o caso é diferente e «trepar» só significa arranjar barriga, calvície, etc.

Erik Satie
In: Memória de um amnésico / trad. Alberto Nunes Sampaio. Lisboa: Hiena, 1992 , p. 62

2 comentários:

  1. Estou deliciada com as "Memória de um amnésico".

    Descobri tarde mas valeu a pena! Obrigada.

    "«trepar» significaria, quando o espírito é honesto, o espírito é recto, tender para uma melhoria, conseguir um aumento..."

    No bom sentido de Satie vamos trepar.
    A.R.

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  2. Sempre os houve, em todas as épocas. É a natureza humana.

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