segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Jorge Luís Borges, Poesia e fragrância!

Poema

ANVERSO

Dormias. Eu acordo-te.
A manhã imensa oferece-nos a ilusão de um princípio.
Esqueceras-te de Virgílio. Aqui estão os hexâmetros.
Trago-te muitas coisas.
As quatro raízes dos Gregos: a terra, a água, o fogo, o ar.
Um só nome de mulher.
A amizade da lua.
As claras cores do atlas.
O esquecimento, que purifica.
A memória que escolhe e redescobre.
O hábito, que nos ajuda a sentir que somos imortais.
A esfera e as agulhas que dividem o intangível tempo.
A fragrância do sândalo.
As dúvidas a que chamamos, não sem alguma vaidade, metafísica.
A curva do bastão que a tua mão guarda.
O sabor das uvas e do mel.

Jorge Luís Borges, "A Cifra (1981) "in Obras Completas III, 1975-1985, Lisboa: Editorial Teorema, p. p.333

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