quarta-feira, 4 de março de 2009

Temos, é certo, alguns escritores e artistas que são homens de talento. Fernando Pessoa!

AlmadaNegreiros, Fernando Pessoa


Temos, é certo, alguns escritores e artistas que são homens de talento; se algum deles o é de génio, não sabemos, nem para o caso importa. Nesses, evidentemente, não se pode revelar em absoluta o espírito de imitação, pois isso importaria a ausência de originalidade, e esta a ausência de talento. Esses nossos escritores e artistas são, porém, originais uma só vez, que é a inevitável. Depois disso, não evoluem, não crescem; fixado esse primeiro momento, vivem parasitas de si mesmos, plagiando-se indefinidamente. A tal ponto isto é assim, que não há, por exemplo, poeta nosso presente – dos célebres, pelo menos - que não fique completamente lido quando incompletamente lido, em que a parte não seja igual ao todo. (…)
O mesmo provincianismo se nota na esfera da emoção. A pobreza, a monotonia da emoção nos nossos homens de talento literário e artístico, salta ao coração e confrange a inteligência. Emoção viva, sim, como aliás era de esperar, mas sempre a mesma, sempre simples emoção, sem auxílio crítico da inteligência ou da cultura.


O caso mental português de Fernando Pessoa seguido de A loucura universal de Raul Leal, Lisboa: Padrões Culturais Editora, 2007, p.29-32.

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