quarta-feira, 13 de maio de 2009

"Histórias do Bom Deus", Rainer Maria Rilke!

O Mendigo e a Altiva Donzela

Era em Florença. Lourenço di Medici, jovem ainda não soberano, acabava de compor o poema “Trionfo di Bacco ed Arianna” e já todos os jardins o ecoavam. Havia poesia viva nessa época. Da escuridão do Poeta levantavam-se as vozes e nelas, vogavam, arrojadas, como em canoas prateadas, rumo ao desconhecido. O poeta começava uma canção e todos que a cantavam concluíam. No “Trionfo”, como na maioria das canções daquela época, a vida, esse violino de cordas luminosas e cantantes, era exaltada, bem como o seu fundo obscuro: o murmurar do sangue. As longas estrofes, incomparavelmente extensas, sobem numa alegria louca; mas aí, onde fica ofegante, surge um refrão simples e breve, que se lança de alturas vertiginosas e com medo do abismo, parece fechar os olhos. Dizia assim:


‘‘Quant’è bella giovinezza,
che si fugge tuttavia!
chi vuol esser lieto, sia:
di doman non c’è certezza…”

Que bela é a juventude que nos alegra!
Mas quem quer retê-la? Ela foge e arrepende-se
E se alguém quer ser alegre que hoje o seja,
E para amanhã não há qualquer certeza.

Rainer Maria Rilke, Histórias do Bom Deus, Vila Nova Famalicão: Quasi, 2008, p.87.

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