domingo, 6 de dezembro de 2009

G. Donizetti: o Bel Canto ao serviço da História

A estreia de Dom Sébastien, roi de Portugal realizou-se no Théâtre de l’Opéra de Paris a 13 de Novembro de 1843. Os cinco actos contaram com quase 500 intervenientes em palco, desde cantores, bailarinos a “meros” figurantes. O tenor Gilbert –Louis Duprez interpretou o primeiro D. Sebastião da história operática. O papel de Camões coube a Paul Barroilhet e o de Zayda à meio-soprano Rosine Stolz. Duprez e Stolz reencontraram-se nesta produção, pois ambos tinham já contracenado na ópera sobre a vida de Leonor de Gusmão, intitulada La Favorite, em Paris, três anos antes.
Numa correspondência dirigida ao seu amigo August Thomas de Viena no dia seguinte, Donizetti transmite as suas impressões (trad. inglês): “I believe that the success has been one of the most clamorous possible. If such enthusiasm is maintained in subsequent performances I shall be very happy. In the midst of this let me tell you that (the journal) Le Charivari, to which they always give 5 tickets, received only 2 and sent them back; imagine what it will say.

No entanto, estes receios não se confirmaram. A crítica do jornal, publicada a 15 de Novembro, apreciava a nova obra de Donizetti de forma benevolente, chamando apenas atenção para a pompa excessiva do cortejo fúnebre. Na verdade, a encenação do funeral ocorreu num momento menos feliz: em 1842, falecera o filho mais velho de Louis-Philippe, o Duque Ferdinand-Philippe d'Orléans, considerado um dos poucos membros populares da família real francesa na época. A cena do funeral, em todo o seu esplendor, terá suscitado recordações tristes desse trágico acontecimento por parte do público. Segundo testemunhos da primeira récita, terá a Marquesa de Las Marismas desmaiado, e o Príncipe de Joinville ter-se-á retirado de comoção na parte discreta do seu camarote.

As reacções, quer do público, quer de críticos, foram favoráveis de modo geral. O libretista de Don Pasquale, Giovanni Ruffini, referia a 20 de Novembro (trad. inglês): “Last week was, it may be said, a week of terrible theatrical fatigue. On Monday to D. Sébastien, on Tuesday to Maria di Rohan. … There’s very beautiful music in these two operas, very fine pieces! There are twenty-four of them in D. Sébastien, a colossal score. The sucess of the two operas has been all that one would desire; that of D. Sébastien greater than that of Maria. “

Gaetano Donizetti reviu a versão original, tendo assim criado uma versão para a “província” francesa, menos exigente em cenários e mais apta aos palcos fora de Paris. Introduziu novamente alterações por ocasião da estreia em Viena, interpretada em alemão no Kärtnertortheater a 6 de Fevereiro de 1845. O público austríaco aclamou Dom Sébastien que permaneceu no repertório vienense em todas as temporadas até 1865.


O destino desta ópera, tal como o do protagonista, caiu em desgraça a partir de 1880. Dom Sébastien desapareceu praticamente das programações operáticas a partir dessa data, excepto algumas produções em Itália entre 1909 e 1911. Ao contrário de outras obras de Donizetti, não renasceu do esquecimento após 1945. Poucas foram as tentativas de repor o rei português em palco. O único registo sonoro em CD data de 2005, captado no Covent Garden londrino com a excelente interpretação de Vesselina Kasarova no papel de Zayda.

Dom Sébastien, roi de Portugal passou pelo Teatro Nacional de S. Carlos em Lisboa em 1845 e pelo Teatro Nacional de S. João no Porto em 1855. Desde então, aguardamos a vinda musical do Desejado …


Segunda imagem: Gilbert-Louis Duprez, o "primeiro" D. Sebastião operático; Terceira imagem: a meio-soprano Rosine Stolz

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