Aqui há dias falava-se em comemorações. Estas, para além do que ensinam através da reflexão que motivam, são também um acto de justiça.
Não se trata de socialmente registar o desaparecimento de Alguém que, mercê de representações políticas extintas mas socialmente presentes, ocupou esta ou aquela posição. Atrevo-me a homenagear aqui uma Pessoa que, nos cinquenta anos de casamento, partilhou activamente uma vida de um verdadeiro Príncipe. Na verdade, soube ontem que tinha morrido a Arquiduquesa Regina, na quarta-feira de manhã.
Não apostando no estafado cliché que aponta para alguém que está por detrás de um grande Homem (sendo certo que, quer esta, quer a consideração inversa são muito falíveis), o Arquiduque Otão de Habsburgo e a Arquiduquesa Regina viveram uma história insólita (no bom sentido) no plano das famílias anteriormente reinantes.
Numa assunção notável das responsabilidades familiares, sem esquecer os povos que compuseram a monarquia austro-húngara (e tão precisados estavam, em especial os que ficaram do lado errado do muro), a Família Imperial, com o seu Chefe à cabeça, incorporou-se no século XX, lutando contra as suas injustiças com as armas que a sociedade democrática proporciona, com a pena e não com a antiga espada, para usar outro cliché.
Adversário do Anschluss e do nazismo, corre o rumor de que o Arquiduque Otão tinha sido um dos beneficiários da acção de Aristides de Sousa Mendes, o que todavia nunca confirmei se era verdade. Mas a ser, era bonito, para quem, simultaneamente, é descendente de D. Pedro IV e de D. Miguel I.
Por voto dos seus novos compatriotas alemães, o Doutor Otão de Hasburgo ocupou durante vinte anos um lugar no Parlamento Europeu, tornando-se uma das suas figuras tutelares. Concorde-se ou não com as suas ideias, pelo menos não há que negar a sua qualidade de grande Europeu e a coerência da sua visão sobre o futuro do nosso continente, assente, como defende na tradição de Coudenhove-Kalergi, nos três montes fundadores, o Gólgota, a Acrópole e o Capitólio.
Filha de um príncipe alemão que morreu prisioneiro de guerra na então União Soviética, a Arquiduquesa Regina partilhou a segunda metade dos 97 anos com que conta hoje o seu Marido, usando um espanholismo, numa vida "exitosa" e nada mundana. Obrigado também por isso.
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Numa nota pessoal, impressionou-me saber ontem à noite da notícia, quando, nessa mesma manhã, tinha escolhido o opus 76 de Haydn para ouvir no rame-rame do trânsito, lembrando-me especialmente da Família de Habsburgo no segundo andamento do segundo quarteto, o qual, como sabem, é um conjunto de variações sobre o antigo hino imperial, hoje hino da Alemanha.
Na passada segunda-feira realizou-se na Igreja da Encarnação, ao Chiado, a Missa de Sufrágio pelas almas de D.Carlos I e do Príncipe Real, por impedimento de S.Vicente de Fora.
ResponderEliminarNa homilia referiu-se o celebrante à muito conhecida tradição de inumação dos Habsburgos na cripta dos Capuchinos,Viena, em que só é admitido o falecido quando é dito apenas o seu nome cristão e a sua condição de simples pecador.
Impressionante ouvir relembrar esse ritual fúnebre e dias depois tomar conhecimento da morte da Arquid. Regina.
Mas parece que o corpo não vai para os Capuchinhos, mas sim para a cripta da família de Meiningen.
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ResponderEliminarEu, republicano, me confesso que gostei muito do seu post.
ResponderEliminarTambém gostei do seu post!
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