Columbano - Retrato de Bulhão Pato, 1923
«Bom sucesso ninguém diz,
Fica melhor delivrança,
Que assim se fala na França,
E as modas vêm de Paris.»
Primeira quadra dos «Versos caparicanos», escritos em 1905, por Bulhão Pato (1928-1912), que morreu faz hoje 98 anos, no Monte da Caparica. Não velem nada, como poderão conferir nos Comentários. Só os escolhi porque há vários «caparicanos» de adopção, aqui no blogue.
"Que assim se fala na França, / E as modas vêm de Paris" são dois versos muito citados mas não imaginava que fossem de Bulhão Pato.
ResponderEliminarEstamos sempre a aprender, o pior é que amanhã esquecemo-nos novamente. Não é?
ResponderEliminarAqui ficam, completos:
ResponderEliminarVERSOS CAPARICANOS
Conselhos a um rapazito esperto
Bom sucesso ninguém diz,
Fica melhor delivrança,
Que assim se fala na França,
E as modas vêm de Paris.
Tampouco sobrelevar,
Que em português transcendente
Salientar vem de saliente,
E cai-lhe mesmo a matar!
A palavra concorrência
Passou como velharia.
Fica melhor hoje em dia
Dar-lhe o nome de Assistência.
Rapariga... ouves dizer:
(Andas sempre de alcateia
Contra estas folhas da aldeia.)
Mademoiselle, há-de ser.
Não uses, moço discreto,
Jamais de completamente,
Que a geringonça, actualmente,
Não quer senão: por completo.
Fétiche, afirma o Littré
Vir do português feitiço;
Mas tu não me digas isso,
Senão fétiche en français!
Também um pico de inglês
Não destoa neste instante.
Flirtar é mais elegante,
Que o cortejar português.
Montra?... Sim. Então que tal...
Havia ser mostrador?...
São coisas que têm bolor,
Sediças... de Portugal!
Hoje, frase de puristas,
Com elegância a valer,
Francês e inglês há-de ter,
Senão é de Quinhentistas.
Companheira é como se chama
À mulher o povo inculto,
O burguês, homem mais culto,
Não diz senão: a madama!
O tempo, corrente viva,
Nos leva no turbilhão,
pai e mãe do coração,
da boca a língua nativa!
Se um jovem na adolescência
Dá em verso o seu recado,
É chamar-lhe um consagrado,
Doublé de vária ciência!
Se algum intelectual,
(Isto de ter intelecto
É só para o mais dilecto
Do mistério genial!)
Rompe num grande fracasso,
Botando fumos de esteta,
Embora seja um pateta,
Chama-lhe tu: talentaço!
1905
Bulhão Pato (1928-1912)
In: Faiscas de fogo morto. Lisboa: Typ. da Academia Real das Sciencias, 1908