terça-feira, 28 de setembro de 2010

É mais que uma ilha – é uma estátua erguida ...

O mar, o desassossego, a saudade...
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Pico, Açores
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fotografia retirada do link assinalado e tratada por mim

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Isto que de longe era roxo e diáfano, violeta e rubro, conforme a luz e o tempo, aparece agora, à medida que o barco se aproxima negro e disforme requeimado e negro, devorado por todo o fogo do inferno. É um torresmo. Nunca labareda mais forte derreteu a pedra até cair em pingos e desfazer-se em cisco. É uma imagem a negro e cinzento que me mete medo. Há por aí buracos e furnas onde a lava formou colunatas e estalactites azuladas, grandes cachos pendentes derretidos pelo calor e solidificados pelo resfriamento. Esta ilha – a maior dos Açores – é negra até às entranhas, na própria terra, na bagacina das praias, no pó das estradas, nas casas, nos campos divididos e subdivididos por muros de lava, nas igrejinhas das aldeias, requeimadas e tristes. O aspecto é dum grande luto, duma grande desolação…
Esta ilha negra e disforme apoderou-se dos meus sentidos. Tudo o que a princípio me repetia, o negrume, o fogo que a devora, o mistério, tudo me seduz agora. O Pico é a mais bela, a mais extraordinária ilha dos Açores, duma beleza que só a ela lhe pertence, duma cor admirável e com um estranho poder de atracção. É mais que uma ilha –é uma estátua erguida até ao céu e moldada pelo fogo – é outro Adamastor como o do cabo das Tormentas

Raul Brandão, As Ilhas Desconhecidas

In, Susana Maria Pereira da Costa Goulart, O Pico (séculos XV-XVIII), contributo para o estudo de uma ilha “com pouca História2, UA, Ponta Delgada, 1995

3 comentários:

  1. Esta ilha não conheço. Falta-me visitar uma parte do arquipélago açoriano, mas há sempre tantas outras viagens que se impõem.

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  2. Luís,
    Vale a pena, tem um mistério invulgar.
    Vivi na Residêncial do Pico de 1991para 1992, foi um ano de sensações e de eremitismo gratificante!
    O mar deixa saudades!:)

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  3. Também não conheço esta ilha e gostava de a visitar.
    Também gostava de ler este livro de Raul Brandão.

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