Monet - Gare St. Lazare, 1877
Chicago, The Art Institute of Chicago
Monet - Gare St. Lazare: Chegada de um comboio, 1877
Col. particular
Monet - Gare St.-Lazare, 1877
Londres, The National Gallery
«Felizmente que havia Monet, que reagiu de maneira desconcertante. A sua recusa do fracasso e dos outros fracassos que impiedosamente se seguiram concretizou-se sob a forma de uma acção tão inesperada que, quarenta anos depois, o meu pai ainda se ria. A sua paisagem Impressão [que deu origem à palavra impressionista, para designar esta corrente pictórica] tinha sido zurzida principalmente porque "não se via nada". Monet, sobranceiro, encolhia os ombros: "Pobres cegos que querem descortinar tudo através da bruma!" Um crítico tinha-lhe declarado que a bruma não era tema de pintura. "Porque não um combate de negros dentro de um túnel?" Toda esta incompreensão tinha reforçado em Monet a determinação irresistível de pintar algo ainda mais brumoso. Uma bela manhã acordou Renoir com um grito triunfal: "Já descobri... a Gare Saint-Lazare! No momento da partida, as locomotivas lançam um fumo tão espesso que não se distingue praticamente nada. É um encanto, uma coisa feérica." Não era sua ideia pintar a Gare Saint-Lazare de memória, mas ir ao local para captar o jogo dos raios ed sol nas baforadas de vapor saídas das chaminés. "Vai ser preciso atrasar a partida do comboio para Ruão. A luz é melhor meia hora depois da partida." "Estás maluco."
«Os "impressionistas" não tinham nada para comer, no verdadeiro sentido da expressão. Viviam de alguns convites para jantar. O meu pai já nem sequer ia à leitaria habitual, cuja gentil proprietária, a Sr.ª Camille, lhe teria vendido fiado. Tinha medo de nunca mais poder pagar. [...] Cézanne tinha voltado para Aix. Degas fechava-se no seu confortável apartamento da Rue Victor-Massé. Monet estava acima de tais contingências. Vestiu o seu melhor fato, esticou os punhos de renda e, balouçando negligentemente uma bengala com castão de ouro, mandou entregar o seu cartão de visita ao director dos Caminhos-de-Ferro do Oeste, na Gare Saint-Lazare. O porteiro, estupefacto, mandou-o entrar imediatamente. A alta personalidade indicou uma cadeira ao visitante, que se apresentou com a maior simplicidade. "Sou o pintor Monet." O director em questão não sabia nada de pintura, mas não ousava confessá-lo. Monet deixou-o em suspenso durante alguns instantes, até que se dignou anunciar-lhe a grande novidade. "Resolvi pintar a sua estação. Hesitei muito entre a Gare du Nord e a sua, mas acabei por concluir que a sua tem mais carácter." Conseguiu tudo o que queria. Atrasaram os comboios, evacuaram as plataformas, atafulharam as locomotivas de carvão para que elas cuspissem a quantidade de fumo que Monet queria. Este instalou-se na estação como um tirano, ai pintou durante dias inteiros no meio do recolhimento geral, respeitosamente cumprimentado por todo o pessoal, a começar pelo director. Renoir concluía: "E eu que não teria sequer coragem para ir instalar-me na montra da mercearia da esquina!"
«Paul Durand-Ruel não só ficou com as gares Saint-Lazare como ainda adiantou algum dinheiro aos seus protegidos. Esta prova de vitalidade da nova escola foi proveitosa para todos.»
«Os "impressionistas" não tinham nada para comer, no verdadeiro sentido da expressão. Viviam de alguns convites para jantar. O meu pai já nem sequer ia à leitaria habitual, cuja gentil proprietária, a Sr.ª Camille, lhe teria vendido fiado. Tinha medo de nunca mais poder pagar. [...] Cézanne tinha voltado para Aix. Degas fechava-se no seu confortável apartamento da Rue Victor-Massé. Monet estava acima de tais contingências. Vestiu o seu melhor fato, esticou os punhos de renda e, balouçando negligentemente uma bengala com castão de ouro, mandou entregar o seu cartão de visita ao director dos Caminhos-de-Ferro do Oeste, na Gare Saint-Lazare. O porteiro, estupefacto, mandou-o entrar imediatamente. A alta personalidade indicou uma cadeira ao visitante, que se apresentou com a maior simplicidade. "Sou o pintor Monet." O director em questão não sabia nada de pintura, mas não ousava confessá-lo. Monet deixou-o em suspenso durante alguns instantes, até que se dignou anunciar-lhe a grande novidade. "Resolvi pintar a sua estação. Hesitei muito entre a Gare du Nord e a sua, mas acabei por concluir que a sua tem mais carácter." Conseguiu tudo o que queria. Atrasaram os comboios, evacuaram as plataformas, atafulharam as locomotivas de carvão para que elas cuspissem a quantidade de fumo que Monet queria. Este instalou-se na estação como um tirano, ai pintou durante dias inteiros no meio do recolhimento geral, respeitosamente cumprimentado por todo o pessoal, a começar pelo director. Renoir concluía: "E eu que não teria sequer coragem para ir instalar-me na montra da mercearia da esquina!"
«Paul Durand-Ruel não só ficou com as gares Saint-Lazare como ainda adiantou algum dinheiro aos seus protegidos. Esta prova de vitalidade da nova escola foi proveitosa para todos.»
Jean Renoir - Pierre-Auguste Renoir, meu pai. Lisboa: Bizâncio, 2005, p. 147
Já não me lembrava destes quadros de Monet. Gostei de reler este trecho que, de tão vivo, vemos a cena.
ResponderEliminarEstou nas últimas páginas, eadorei o livro.
ResponderEliminarDurante uns dias, ainda vou colocar uns excertos, difíceis de seleccionar - são tantas as situações engraçadas e o que ficamos a conhecer da vida (e modo de ser) de Renoir e dos seus amigos...
Deve ser interessante. Vou anotar.
ResponderEliminarBom dia! :)