Lisboa: Sá da Costa, 1926
«Está esquecida esta grande escritora da resistência que se chamou Irene Lisboa e tem chamado a atenção de um crítico ou outro das nossas letras, mas que não há meio de vir a primeiro plano, como tem direito.
«Natural da Murguinheira, perto da Arruda dos Vinhos, nasceu em 1892, filha de um magistrado que ascenderia a juiz do Supremo Tribunal de Justiça; mas nascera fora da legalidade e o complexo não mais a deixaria. Professora primária, o seu talento de escritora manifestava-se desde o livro de estreia, revestia-se da capa de um livro para crianças, mas os «13 contarelos» são bem obra para adultos e dão-nos a garra e o talento narrativo de Irene Lisboa. Publicados em 1926, tinha a autora 34 anos. Não é bem ainda aquela prosa firme, sentida, com laivos de mágoa a ressumar, que virá em Um dia e outro dia, Outono havias de vir, mas os encantos de Lisboa, uma espécie de saudosismo de quem nasceu quando era publicado o Só, mostram-se nesse voluminho que parece para os miúdos e prende os adutos.
«Título simples, desprendido, quase familiar, numa parceria que o era na vida também, já que Irene Lisboa ficaria presa a Ilda Moreira até ao final da sua vida. Reza o título «13 contarelos que IRENE escreveu e Ilda ilustrou para a gente nova».
«É um voluminho de 178 páginas, as últimas das quais não numeradas e que foi composto e impresso, segundo reza o cólofon «na tipografia da Escola Normal de Lisboa»., mostrando-nos que a autora ficara sempre presa à escola onde se formara. E nos mostra também o apetrechamento desta, em 1926. Anos depois, essa mesma escola formadora de professores seria encerrada durante vários amos, como se o País não precisasse de professores. Recorria-se às regentes escolares, algumas das quais mal saberiam «ler, escrever e contar», quanto na filosofia de Salazar bastava ao comum dos cidadãos.
«Irene Lisboa, na poesia, na prosa, no ensaio pedagógico, marcava lugar de destaque. Por isso mesmo passaria a ocultar-se, sob dois pseudónimos: o de João de Falco, na literatura, e o de Manuel Soares, no sector da pedagogia. Colaboradora da Seara Nova, da Presença e de O Diabo, seria o bastante para recear represálias. E João Falco que apareceria com frequência na Seara Nova subscrevia livros como Um dia e outro dia, Outono havias de vir, Solidão, Começa uma vida e Folhas volantes.
«Mais contos viriam com Lisboa e quem cá vive e Esta cidade, um e outro farrapos ou momentos de vida arrancados à cidade, à sua luz e ao seu sentir humano.
«Mas a ensaísta e a pedagoga subscrevia Froebel e Montessori, O primeiro ensino e A iniciação ao cálculo.
«13 contarelos é o livro de estreia. Mas o que atingiu mais alto e mais revela os processos de Irene Lisboa e a sua arte de nos narrar a vida, suas alegrias momentâneas, as decepções e amargos de boca, é talvez Uma mão cheia de nada e outra de coisa nenhuma.
«Escritora esquecida das novas gerações, morreu em 1958. Literariamente bem merecia ser lembrada por qualquer editor.»
Raúl Rêgo«Natural da Murguinheira, perto da Arruda dos Vinhos, nasceu em 1892, filha de um magistrado que ascenderia a juiz do Supremo Tribunal de Justiça; mas nascera fora da legalidade e o complexo não mais a deixaria. Professora primária, o seu talento de escritora manifestava-se desde o livro de estreia, revestia-se da capa de um livro para crianças, mas os «13 contarelos» são bem obra para adultos e dão-nos a garra e o talento narrativo de Irene Lisboa. Publicados em 1926, tinha a autora 34 anos. Não é bem ainda aquela prosa firme, sentida, com laivos de mágoa a ressumar, que virá em Um dia e outro dia, Outono havias de vir, mas os encantos de Lisboa, uma espécie de saudosismo de quem nasceu quando era publicado o Só, mostram-se nesse voluminho que parece para os miúdos e prende os adutos.
«Título simples, desprendido, quase familiar, numa parceria que o era na vida também, já que Irene Lisboa ficaria presa a Ilda Moreira até ao final da sua vida. Reza o título «13 contarelos que IRENE escreveu e Ilda ilustrou para a gente nova».
«É um voluminho de 178 páginas, as últimas das quais não numeradas e que foi composto e impresso, segundo reza o cólofon «na tipografia da Escola Normal de Lisboa»., mostrando-nos que a autora ficara sempre presa à escola onde se formara. E nos mostra também o apetrechamento desta, em 1926. Anos depois, essa mesma escola formadora de professores seria encerrada durante vários amos, como se o País não precisasse de professores. Recorria-se às regentes escolares, algumas das quais mal saberiam «ler, escrever e contar», quanto na filosofia de Salazar bastava ao comum dos cidadãos.
«Irene Lisboa, na poesia, na prosa, no ensaio pedagógico, marcava lugar de destaque. Por isso mesmo passaria a ocultar-se, sob dois pseudónimos: o de João de Falco, na literatura, e o de Manuel Soares, no sector da pedagogia. Colaboradora da Seara Nova, da Presença e de O Diabo, seria o bastante para recear represálias. E João Falco que apareceria com frequência na Seara Nova subscrevia livros como Um dia e outro dia, Outono havias de vir, Solidão, Começa uma vida e Folhas volantes.
«Mais contos viriam com Lisboa e quem cá vive e Esta cidade, um e outro farrapos ou momentos de vida arrancados à cidade, à sua luz e ao seu sentir humano.
«Mas a ensaísta e a pedagoga subscrevia Froebel e Montessori, O primeiro ensino e A iniciação ao cálculo.
«13 contarelos é o livro de estreia. Mas o que atingiu mais alto e mais revela os processos de Irene Lisboa e a sua arte de nos narrar a vida, suas alegrias momentâneas, as decepções e amargos de boca, é talvez Uma mão cheia de nada e outra de coisa nenhuma.
«Escritora esquecida das novas gerações, morreu em 1958. Literariamente bem merecia ser lembrada por qualquer editor.»
In: Diário Popular, Lisboa, 19 Fev. 1981, supl. Letras e Artes, p. I
Entretanto, a Imprensa Nacional e a Presença editaram algumas obras de Irene Lisboa que nasceu no dia de Natal, há 112 anos.
Para c.a. e a sua Casa Improvável.
Que boa lembrança, MR! Que belo presente! :-)
ResponderEliminarBoas Festas, Óptimo Ano!