domingo, 30 de junho de 2013

Uma lição de vida

Lisboa: Bizâncio, 2005
2.ª ed.: 2007

«Mandela tornou-se um herói. É um mito cuja génese, força e exemplo quis aqui narrar. Tive a oportunidade e o privilégio de conhecer Mandela há mais de dez anos, depois de, com muitos outros militantes, ter contribuído para o boicote à antiga África do Sul e militando a favor da sua libertação. 
«Mandela, nascido em 1918, é o rebelde que se empenha no combate à injustiça cometida contra os Negros. Primeiro pela via do direito e da não-violência, como Ghandi, depois, a partir de 1944, na ilegalidade e na clandestinidade. É também o cativo sem ódio que descobre o teatro na prisão e se transforma em homem de Estado pronto a dar provas do seu talento logo que é libertado, numa negociação impossível em que a paciência, a tolerância e a democracia lhe permitem evitar um banho de sangue. É finalmente aquele que renuncia à vingança para personificar uma noção ‘arco-íris’. 
«Foi meu propósito ser um modesto transmissor deste destino aos leitores de hoje, nomeadamente aos jovens.» (Jack Lang)
Este livro de Jack Lang, que li há anos, é muito interessante, dado que a personalidade de Nelson Mandela é abordada de um modo inovador.
«Se a vida é um palco de teatro, em que os homens  e as mulheres desempenham um papel de atores – e é assim que Jack Lang ilustra o seu tema – então o papel de uma grande obra consiste em encarnar, prolongando o tempo da sua passagem, o destino daqueles que, antes dele, foram investidos de idêntica missão. Assim, Jack Lang atribui a Nelson Mandela o papel principal de um maravilhoso drama em quatro atos, que passa em revista a sua vida e a sua época, bem como a formação complexa da luta pela liberdade na África do Sul. Nele, Mandela é identificado com as personagens carismáticas que, de Ésquilo e Sófocles a Beckett, marcaram a história da filosofia e da ação moral.
«No I Ato, Mandela é Antígona perante o rosto soturno do apartheid, que o priva, e ao seu povo, dos seus direitos humanos. No II Ato, surge como chefe de um bando de revoltados contra as forças do regime sul-africano, assumindo os traços do célebre gladiador Espártaco, que outrora se opôs aos Romanos. No III Ato, à imagem de Prometeu, é agrilhoado ao rochedo do racismo por ter roubado aos deuses do apartheid – e dado aos mortais – a chama da resistência a Zeus, chefe máximo do regime impiedoso. Finalmente, no IV Ato, Mandela volta á sua época e à sua idade atuais, mas sob a identidade de Próspero, benfeitor da humanidade e vencedor de Calibã.» (do «Prefácio» de Nadine Gordimer). Finalmente, o V Ato intitula-se «O rei Nelson».
E quais as epígrafes escolhidas para cada um dos atos? I Ato: «Antígona simbolizava a nossa luta; ela era, à sua maneira, uma lutadora pela liberdade.» (Nelson Mandela); II Ato: «Um dono? Que disseste tu? O negro já não tem dono. Espártaco quebrou-lhe as grilhetas algures que não em Roma» (Lamartine, Toussaint-Louverture); III Ato: «Tu és grande, e grande é a prova que vais enfrentar: / A tua glória irá até apo ponto de colidir com o céu.» (Eurípedes, As Bacantes): IV Ato: «Para quê obstinares-te no rancor? Destruída a tua pátria, terás avançado?» (Sófocles, Édipo em Colona); V Ato: «nenhum torpe desígnio, nenhuma ingrata inveja / Atacará o curso de tão bela vida. / Haveis descoberto toda a arte de conquistar os corações.» (Corneille, Cinna)
A vida de Mandela é interligada, em cada um dos atos, com a dos heróis da mitologia.

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