terça-feira, 28 de janeiro de 2014

Of old rolls




Uma vez mais manifestando a minha gratidão pelas mensagens de ontem, respondo, algo tardiamente, ao “desafio” que JAD lançou em http://prosimetron.blogspot.pt/2014/01/um-erro-de-datacao.html

Atribuída a autoria do armorial de onde se retira a imagem acima a William Bruges, Rei de Armas Jarreteira, que morreu em 1450, duvida JAD da datação do manuscrito (e, portanto, da autoria), apontando antes para momento posterior a 1482-85.

Coincidindo este arco temporal com a reforma impulsionada por D. João II das armas portuguesas, não é ousado arriscar que a dúvida em apreço surge da figuração neste fólio, bem distinta, de duas instâncias das armas reais portuguesas posteriores a essa reforma, ou seja, com omissão da cruz de Avis e com os escudetes todos colocados na mesma posição, assim deixando os laterais de se figurar apontados ao centro.

Ora, convém, para superação desta dúvida, convocar o testemunho de Sir Anthony Wagner, longínquo sucessor de William Bruges, a quem muito deve o estudo dos armoriais ingleses e um exemplo de que, se não há pessoas insubstituíveis, há quem não seja substituído.

Adoptando classificação proposta por Sir Anthony e ainda hoje, com poucas alterações, muito usada, o Livro em causa pode ser classificado como um armorial institucional, neste caso recolhendo a identidade heráldica dos membros da agremiação cavaleiresca fundada por Edward III.

Em cada folha, consta o retrato de um dos primeiros companheiros da Jarreteira, identificados pelo listel e especialmente pela heráldica das vestes que envergam. Acompanhando a figura de cada fundador, surgem os escudos dos seus sucessores em cada uma das cadeiras que, longe de mera abstracção, ainda hoje estão disponíveis na Capela de São Jorge, no castelo de Windsor, para acolhimento dos actuais membros da Ordem, nos seus capítulos.

Ora tal lugar, em cada fólio, se inicialmente previsto e preenchido com os cavaleiros que, à data da feitura do Armorial, já se conheciam como tal, foi pensado com visão de futuro e para ulterior completamento paulatino deste rol de cavaleiros da Jarreteira.

No estudo-catálogo que publicou em 1950 sobre armoriais ingleses (A catalogue of english medieval rolls of arms, London: The Society of Antiquaries, 1950), Sir Anthony evidencia as várias mãos que conseguiu identificar e que, pelo menos ao longo de cem anos, foram aditando detalhe a este Livro da Jarreteira. Especificamente falando desta folha, a escrita dos nomes é imputada a John Writhe, Rei de Armas Jarreteira no quarto final do século XV e começo do seguinte, imputando-se os dois escudos finais (precisamente os de Portugal “moderno”) a Sir Thomas Wriothesley, filho e sucessor como Jarreteira de Writhe, possuidores que foram ambos deste manuscrito.

Comparando estes dois escudos de Portugal com os três que os precedem, é evidente a diferente mão que os pintou. Estes últimos, aliás, apresentam ainda as armas usadas pelos Reis de Portugal, desde D. João I até à reforma do seu bisneto e homónimo.

Que estes três escudos de Portugal, da primeira metade da dinastia de Avis, foram pintados quando era esse o ordenamento vigente (e como tal conhecido) da emblemática real lusitana, parece inquestionável, pela ausência de preocupações de rigor histórico.

Esta ausência pode ser exemplificada com a sistemática representação, no esquartelado Plantageneta posterior a Edward III, do quartel francês reduzido a três flores de lis, redução esta que só se inicia no reinado do primeiro Lancaster no trono, Henry IV.

Do mesmo modo, o Duque que está representado como fundador desta cadeira da Jarreteira é Henry of Grosmont, sogro de John of Gaunt e, assim, avô materno da nossa D. Filipa de Lancastre. As armas que lhe são atribuídas correspondem às armas do Plantageneta Rei de França e de Inglaterra, com o esquartelado destes dois reinos, sem a menor diferença. Ora, as armas deste 1.º Duque de Lancastre, bisneto por varonia de Henry III, eram apenas os 3 leopardos deste rei, diferençados por um lambel “de França” (o lambel que vai ser usado, mais tarde, pelo seu bisneto e homónimo Navegador).

Obrigado uma vez mais, especialmente a JAD, também pelo pretexto para lembrar Sir Anthony Wagner, um dos heraldistas que ilumina estes estudos no século findo e de muito prezo possuir alguns livros que, por si anotados, integraram a sua biblioteca.


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