quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

Pensamento ( s )

Barnett Newman, Midnight Blue, 1970.

(...) Se perguntarmos hoje a um miúdo que cor tem o céu, o mais plausível é ouvirmos " azul ". Mas nem sempre foi assim. Mestres indiscutíveis do espírito ocidental como Aristóteles, Lucrécio ou Séneca descreviam o céu como sendo vermelho, amarelo, violeta, verde, laranja. Era desse modo que o observavam, aplicando aí o rigor analítico que lhes reconhecemos. O que só adensa o enigma. Nenhum deles menciona o que depois para nós se tornou óbvio. Isso leva o historiador das cores, Michel Pastoreau, a interrogar se os homens e mulheres da Antiguidade chegaram a ver o azul, ou se alguma vez o viram como nós o vemos. Uma coisa parece certa : as cores não são apenas fenómenos naturais, são também fruto de uma construção humana e cultural complexa. O azul que esteve diante dos olhos de Aristóteles e que ele não contemplou faz-nos pensar naquilo que está hoje patente e acessível a nosso lado, sem que nos demos conta. Pela vida fora há, por isso, uma humilde dúvida que temos de conservar : que cor tem o céu que não chegamos a ver ?

- José Tolentino Mendonça, no Expresso do passado sábado.

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