Acho deliciosa a história de como Jorge Semprún se tornou um adepto de futebol, quando estava clandestino em Madrid e fazia horas entre dois encontros, numa taberna:
«Estava ao balcão, e o meu vizinho diz-me de repente: "Que achou de Di Stefano, ontem?" [...] E repete: "Que achou de Di Stefano, ontem?". Volto-me para ele: "Di Stefano? Quem é? Quién és?" E então ouvi cristalizar, coagular, o silêncio mortal nessa taberna onde só havia homens, como é evidente, porque na Espanha de 1954, às 11 horas da manhã numa taberna, nunca haveria nenhuma mulher. Cerca de quarenta tipos viraram-se para mim, para o marciano que não sabia quem era Di Stefano. Então disse para comigo: se queres continuar a sobreviver na clandestinidade, tens de conhecer os nomes dos jogadores, as equipas, os resultados... Tomei consciência de que não saber quem eram Di Stefano, Gento, Suárez, me desmascararia um dia como estrangeiro, alheio à vida de Espanha.
«Comecei a ler a imprensa desportiva. De repente, passei a interessar-me, primeiro profissionalmente, se assim se pode dizer, e, depois, fui os jogos e tornei-me adepto, ganhei gosto pelo desporto. [...] Pouco a pouco ganhei-lhe gosto e até hoje. Na primeira terça-feira de cada mês, quando temos a reunião do Goncourt, encontro-me com Bernard Pivot e começamos a falar de futebol. A primeira troca de palavras consiste em comentários sobre o último jogo ou os campeonatos que decorrem. Só depois é que falamos do livros... Não estou a brincar!»
Jorge Semprún - A linguagem é a minha pátria. Lisboa: Bizâncio, 2013, p. 106-107
A importância de um desporto.
ResponderEliminarBom dia
Imagino a cena na taberna. Ele não conta, mas deve ter-se posto rapidamente a andar dali para fora. E lá foi 'estudar' os jornais desportivos.
ResponderEliminarBoa semana!