domingo, 28 de dezembro de 2008

Os meus poemas - 20

O DESEJO

O desejo, o aéreo e luminoso
e magoado desejo latia ainda;
não sei bem em que lugar
do corpo em declínio mas latia;
bastava ouvir os olhos para ouvir
o nasalado ardor da sua voz:
era a manhã trepando às dunas,
era o céu de cal onde o sul começa,
era por fim o mar à porta - o mar,
o mar, pois só o mar cantava assim.

Eugénio de Andrade
(1923 -2005)

1 comentário:

  1. Li o "Desejo" ao som do Ravel.
    Bela combinação.
    Gosto imenso do Eugénio de Andrade.

    Lembra-se que há uns anos se editaram uns poemas num maço de cigarros: diz sim à dependência Poética. Não fumo de modo que estes cigarros souberam-me bem.

    Resolvi tirar ao acaso no maço dos poetas anglo-saxónicos e saiu este:

    "Ode a um Rouxinol"
    O meu coração sofre uma pesada
    sonolência
    desce sobre os sentidos, como se tivesse
    bebido cicuta
    ou terminasse agora de esvaziar uma taça
    com um suco
    entorpecedor e denso, até me perder nas
    águas do Letes.

    Não, não é pela inveja da tua feliz sorte,
    mas por participares do seu excesso,
    que tu Dríade alada e ligeira das árvores,
    vens cantar o estio com uma voz plena e
    calma,
    através de um bosque melodioso que nos
    entrega
    a sua frescura e uma sombra inesgotável.
    (...)
    John Keats, in, "diz sim à dependência poética", Editora Ausência, V.N.Gaia, 2000 (20 cigarros 4 euros)
    A.R.
    (Desculpe a extensão do comentário mas foi a maneira que encontrei de agradecer os minutos de Domingo indecisos entre a leitura ou o visionamento de Woody Allen)

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