sábado, 18 de abril de 2009

A política para a droga

Nestes tempos de crise económica, Freeports e BPN, parece que não há tempo nem interesse para falar de droga. Até porque com a despenalização do consumo verificada há uns anos atrás ficou aliviada a consciência de muita gente e o tema deixou de pesar. Mas a verdade é que continua a ser um flagelo, especialmente para as famílias. E embora tenhamos substâncias mais " limpas" a crescer na preferência dos jovens como o ecstasy, que não envolve seringas nem sangues e etc, a verdade é que os riscos para a saúde de quem consome às vezes até são mais agudos do que uma dose de heroína ou cocaína. Foi por isso que li ontem com muito interesse o artigo de Campos e Cunha no Público, de que vos deixo um excerto:

" (...) Como pai e como cidadão, fico aterrado: não conseguiria ( mesmo que quisesse ) estar o dia inteiro atrás de cada filho para evitar a visita do angariador de novos clientes. E estes angariadores são a praga que não se consegue banir nem evitar. O angariador, oportunista da fraqueza de um filho nosso, estará à espreita e pode ganhar a batalha: toda a responsabilidade em dizer não está no nosso filho. Demasiada responsabilidade para uma criança em crise e todas passam por momentos de crise. Por outro lado, a guerra à droga por mecanismos tradicionais abriu falência. Para quem ainda tenha dúvidas veja o filme Traffic, para ilustração do que se passa. As cadeias estão cheias mas a ilusão é total.

Os recursos policiais ( e mesmo militares ) e os custos financeiros no combate ao tráfico de droga são astronómicos mas nada quando comparados com os recursos dos carteis da droga. Ainda assim, valeria a pena se a guerra estivesse a ser ganha; infelizmente, não é o caso. E aí está o problema. Sempre que há sucessos no combate ao tráfico de droga, o preço da droga sobe no retalho, ou seja nas ruas, o que naturalmente aumenta a taxa de lucro dos passadores e traficantes de droga, incentivando ainda mais o comércio da droga. As vitórias na repressão à droga contêm em si a sua própria destruição: fazem aumentar a taxa de lucro do tráfico.

Uma política alternativa tem de ser pensada, discutida por todos: psicólogos, médicos, economistas, especialistas da droga e, naturalmente, políticos. São estes que têm que decidir. Há riscos que têm de ser avaliados, sem populismos, sem assustar as pessoas, sem demagogias. Lembro-me que o populismo foi tremendo, quando deixou de ser crime o consumo ( apenas o consumo ) da droga. Ou seja, a toxicodependência deixou de ser crime para ser uma doença. Hoje, ( veja-se o Finantial Times do dia 13 de Abril ) Portugal é citado como um exemplo a seguir.

Avalie-se, também, o exemplo suiço, em que a droga deixou de ser comprada na rua, para ser adquirida na farmácia com receita médica. Poupam-se milhões que podem ser canalizados para a recuperação dos toxicodependentes que estejam dispostos a tal. Deixa-se o passador sem negócio porque quem de facto precisa dela pode adquiri-la na farmácia, sem misturas mortais e sem seringas infectadas. Mais, deixa de haver o angariador toxicodependente porque não necessita de clientes porque pode obter a droga na farmácia. E se contaminasse mais um colega ele não ganharia nada com isso, ninguém lhe quereria comprar nada no futuro. A profissão desapareceria. Mas, acima de tudo, levávamos à ruína os cartéis da droga que financiam o terrorismo na América do Sul, o terrorismo dos radicais do Afeganistão e o terrorismo nas nossas famílias. Matamos o mal onde ele está.

Um especialista em droga, doutorado numa boa universidade americana, dizia-me que, com o processo das mãos-limpas em Itália, descobriu-se que a máfia financiava campanhas contra a despenalização do comércio da droga. Pessoas bem intencionadas e que pensavam estar a combater a máfia da droga estavam ingenuamente e apenas a assegurar-lhe um futuro próspero.

E temos de repensar a abordagem do combate à droga enquanto as instituições não estejam contaminadas, pois o tráfico de droga corrompe a polícia, a justiça e o sistema político. Amanhã pode ser tarde demais. "

- Luís Campos e Cunha, Droga de leis, no PÚBLICO de ontem.

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