domingo, 16 de outubro de 2011

Uma pausa ao fim do dia

Por vezes faz bem ler qualquer coisa que nos tire do sério (das notícias, da crise, do não pagamento de partes de ordenado e até do nosso quotidiano).
Hoje comprei um livrinho desses, escrito por Armando Ferreira. Trata-se da 2.ª edição de A barata, Loira (Lisboa, Livraria Editora Guimarães & C.ª, 1943). 
A Cló tinha finalmente arranjado um emprego... como tinha boa voz foi contratada para "sepica" [sic] "ou lá o que é, uma voz de mulher para anunciar as músicas, e ler os reclames e os nomes dos sócios".

Vamos ao livro:
........
Às dez horas já João Pedro estava de ouvido perto do aparelho do pai Estanislau, e nervoso pedia a todos:
- Não façam barulho; deixem ouvir. Não a atrapalhem. Está a terminar este trecho de Liszt. Muito dura Liszt...
- Sed... litz - completou o Gualberto que também ouvia a emissão.
- Lá vai ela falar! É ela! É ela!
«Acabaram Vossas Excelências de ouvir a Rapsódia Húngara de Liszt» (Pausa) «Enjeitadinho».

"Porque choras tu, anjinho?
Tenho fome e tenho frio..." 
- Que expressão! Como ela diz bem os versos sentimentais!
"E só por este caminho
Sem um abafo quentinho
Dos Armazéns do Rossio !!

«Vão V.as Ex.as ouvir em seguida a Berceuse de Jocelyn...

- O quê ? O que é que ela diz ? - perguntou o Estanislau que era pouco conhecedor de música - Jergelim e amendoa doce?

- Ó senhores, calem-se por amor de Deus - suspirava João Pedro. Ficava em silêncio a olhar o mostrador iluminado, embaldo pela música, à espera que ela falasse de novo - Lá vai ... lá vai... Oiçam. Que forma! Que enfase! Que voz ! ! !

«O melro»
O melro eu conheci-o,
Era negro, vibrante, luzidio,
Logo de manhã cedo,
Da porta que dá para o passal
Entre verdadeiras risadas de cristal
Dizia o velho: se queres cura
Toma xarope reumatismal..."


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