Por vezes faz bem ler qualquer coisa que nos tire do sério (das notícias, da crise, do não pagamento de partes de ordenado e até do nosso quotidiano).
Hoje comprei um livrinho desses, escrito por Armando Ferreira. Trata-se da 2.ª edição de A barata, Loira (Lisboa, Livraria Editora Guimarães & C.ª, 1943).
A Cló tinha finalmente arranjado um emprego... como tinha boa voz foi contratada para "sepica" [sic] "ou lá o que é, uma voz de mulher para anunciar as músicas, e ler os reclames e os nomes dos sócios".
Vamos ao livro:
........
Às dez horas já João Pedro estava de ouvido perto do aparelho do pai Estanislau, e nervoso pedia a todos:
- Não façam barulho; deixem ouvir. Não a atrapalhem. Está a terminar este trecho de Liszt. Muito dura Liszt...
- Sed... litz - completou o Gualberto que também ouvia a emissão.
- Lá vai ela falar! É ela! É ela!
«Acabaram Vossas Excelências de ouvir a Rapsódia Húngara de Liszt» (Pausa) «Enjeitadinho».
"Porque choras tu, anjinho?
Tenho fome e tenho frio..."
- Que expressão! Como ela diz bem os versos sentimentais!
"E só por este caminho
Sem um abafo quentinho
Dos Armazéns do Rossio !!
«Vão V.as Ex.as ouvir em seguida a Berceuse de Jocelyn...
- O quê ? O que é que ela diz ? - perguntou o Estanislau que era pouco conhecedor de música - Jergelim e amendoa doce?
- Ó senhores, calem-se por amor de Deus - suspirava João Pedro. Ficava em silêncio a olhar o mostrador iluminado, embaldo pela música, à espera que ela falasse de novo - Lá vai ... lá vai... Oiçam. Que forma! Que enfase! Que voz ! ! !
«O melro»
O melro eu conheci-o,
Era negro, vibrante, luzidio,
Logo de manhã cedo,
Da porta que dá para o passal
Entre verdadeiras risadas de cristal
Dizia o velho: se queres cura
Toma xarope reumatismal..."
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