quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Sob o olhar da lente - 1

Inteiramente dedicado à imagem este é o novo espaço que a partir de hoje vai certamente conquistar o seu lugar no nosso blogue. Aqui irei revelando a paixão e o talento de alguns amigos na área da fotografia numa perspectiva mais profissional ou mais amadora, mas sempre com a sensibilidade e o bom gosto que os caracteriza na relação que têm com a objectiva. Neste caso, refiro-me a Jorge Pereira de Sampaio, amigo de longa data e autêntico homem dos “sete ofícios” e António Nobre Marques, jornalista com actividade mais direccionada para o audiovisual e com quem já tive o prazer de trabalhar.
Dois olhares sobre Salvador da Bahia é a série que inaugura a nova secção.



A vendedora de bonecas de pano, foto de Jorge Pereira de Sampaio


Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos vista do interior
da Fundação Jorge Amado, foto de António Marques

7 comentários:

  1. Sempre gostei de observar aquilo que os outros interiorizam "sob o olhar de uma lente" num bom ou mau momento. É uma boa caixa de surpresas esta rúbrica.
    São bonitas estas fotografias.
    A.R.

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  2. Que bonita a fotografia do António Marques que não tenho o gosto de conhecer. Salvador é uma cidade surpreendente e riquissima de imagens onde o Belo está presente em cada esquina, em cada praça, em cada rua. O olhar desta vendedora de bonecas, por exemplo, teazia uma doçura de quem já viveu muito e sabe (certamente) viver a vida que não deve ser fácil, mas com alegria de viver. Fico feliz pelo meu querido amigo Mário, de tantos e tantos anos, ter escolhido esta imagem que marca a primeira vez que apresento em público uma fotografia feita por mim. JPS

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  3. Que lindas fotos. Dariam poesia. Não há um poeta no blog para as acompanhar?

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  4. Belas fotos de uma cidade que ainda não tive o prazer de conhecer.Parabéns aos fotógrafos e ao MLV.

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  5. Jorge, és um homem cheio de talento. Belas fotos. Parabéns. IN

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  6. Jorge: que bela foto...aliás como já nos vem habituando! Parabéns!

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  7. Muito obrigado.
    Poesia?

    "Chovia e a vista de Salvador da Bahia era a de uma grande e triste cidade ao longo da costa. Ela ali estava à nossa frente, cinzenta, e era a evidência inegável de que não poderia ficar, indefinidamente, no mar. O navio atracou e era o momento de pôr os pés em terra".....
    "O Largo do Pelourinho respira ainda as histórias de Jorge Amado, as histórias de mulheres que vendiam o corpo para viver, homens que se faziam ao mar e que se perdiam em terra quando não era o mar que os tragava, capoeiristas, malandros e trabalhadores honestos, sempre explorados pelos senhores brancos da cidade.
    E ainda hoje é assim." ...
    " sem poder definir onde acabava a minha imaginada Bahia de Todos-os-Santos. E, por isso, sinto-a mais. Ninguém a vê como eu; ninguém a tem assim.
    Comprei cocada, um doce feito só de coco ralado e açúcar, à vendedora que tem o lugar cativo na escadaria da grande casa azul da fundação Jorge Amado. Entrei na loja, comprei um livro do escritor que ainda era vivo na altura e deixei-me ficar sentado, lendo, comendo doces acabados de fazer que ia comprando à medida do apetite e olhando de vez em quando a ladeira com a alta igreja azul forte de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos à direita.
    Por ali me deixei ficar, horas a fio perdido em leitura e na contemplação de um cenário tão colorido como um filme de animação. Ouvia a cantilena dos miúdos de uniforme na escola ao lado. Nos intervalos assomavam às varandas para, como eu, verem os passantes. A vida é o maior espectáculo. Há uns tontos que dizem que o teatro é maior que a vida. Só se for da sua própria curta existência que se esgota num de faz de conta. Tudo o que se adora parece maior, mas não é. Tem a sua dimensão perecível. Nem disso queria saber. Com um livro na mão, um doce e a ladeira do Pelourinho aos pés, sabia que tinha muita sorte por estar ali e sentia-me grato.
    Cortava o cordão umbilical que me ligava ao navio. "...
    " Passear com aquela morena de vestido de baiana verde brilhante ao sol tropical era como se fosse Carnaval. Dava mais alegria àquelas ruas por onde passava, a morena de branco riso aberto. Levou-me por vielas e ruelas a nascente do pelourinho. Sabia quando passava para lá dos limites da parte recuperada, da cidade de cara lavada, quando ultrapassávamos a vigilância dos polícias metidos nos coletes à prova de bala. O piso continuou a ser o mesmo, tecido grosseiramente com pedras irregulares. Mas mais uma pequena parte da cidade se ia revelando docemente enquanto caminhava a seu lado. Deixámos para trás o cenário das ruas coloridas do pelourinho que rebentavam de cor, de movimento, de gentes. Sabia que as casas vestidas de garridas pigmentações permaneciam muito próximas, tornando o contraste maior.
    Naquelas ruas em que deambulávamos agora, sem sermos nós próprios, a velha S. Salvador da Bahia de Todos-os-Santos estava sem vivalma e virtuosamente nua. O casario, semelhante ao do pelourinho, era totalmente branco, um branco meio sujo e descascado pelos anos; branco como as roupas festivas do candomblé, branco puro e antigo, respeitável e venerável. O vestido verde de Cláudia ficou mais ainda mais viçoso e ela mais morena e o seu enorme sorriso branco ofuscou, espalhou-se e confundiu-se com a cidade e com o mundo. E as ruas já não eram ruas; eram nuvens brancas e, nós, sem piso e sem peso, flutuávamos no nada, balões subindo com os escaldantes raios de sol, absorvendo cidade e pessoas e coisas boas, vogando ao sabor da brisa cálida, derramando-nos, reflectindo sobre telhados e cabeças o que ia dentro de nós.
    Lá em cima tudo era igualmente importante. Respirava o ar limpo e leve; Cláudia guiava-me despreocupadamente entre sopros, deslizando no gozo da vertigem." Bahia dos Demónios. Meu

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