«Todas as tardes, quando saía da escola, Pinóquio entretinha-se a ver os seus companheiros aos pontapés à bola de trapos e ria a bom rir com os encontrões que eles davam uns nos outros, o que, muitas vezes, originava quedas aparatosas e zangas entre os jogadores que, ao chegarem a casa com os fatos rasgados, o calçado estropeado, e as mãos, as pernas e as caras esfoladas, recebiam de seus pais o devido correctivo» assim começa o livro de José Rosado, Pinóquio joga à bola (des. de Amorim. Lisboa: Romano Torres, 1957), da colecção Manecas.
Lisboa: Vega, 1991 «Dez anos depois, João, Raul e José Francisco encontraram-se no Aeroporto de Lisboa, num dia de grande movimento, com jornalistas e fotógrafos por toda a parte: entrevistas para a Rádio e para a Televisão. Ia partir para o Brasil a selecção de futebol e João, o guarda-redes, era o jogador mais procurado pelos repórteres. Ia ter a sua estreia internacional. Acabara de fazer vinte anos apenas, mas tinha revelado já uma classe tal que perfeitamente justificava a escolha do seleccionador.» (p. 67)
Lisboa: Vega, 1991
«Bola: É o primeiro brinquedo da criança, uma coisa mesmo a jeito para ser jogada; dá satisfação mexer-lhe com as mãos, com os pés, com a cabeça. Todos devemos ter direiro de jogar à bola, desde criança até todas as idades. A bola não tem idade, não tem bicos, não tem preferências, é igual para todos; é o jogo perfeito. Diz-se que a bola é redonda e são onze de cada lado e, com isso, quer-se dizer... isso mesmo. Que ela não terá favoritismos para uns ou para outros, que é imparcial, que está ali para ser jogada e que quem a jogar melhor deverá ser o vencedor do jogo. Sendo a bola assim tão prestável, tão amiga, tão colaborante, devemos tratá-la bem, com jeito, com habilidade... Os brasileiros até lhe chamam a "menina"... Carlos Pinhão - «Futebol de A a Z. In: Abril Futebol Clube, p. 88
Albert André (1869-1954) - Taça de peras, pão e um copo sobre a mesa Boston, Museum of Fine Arts
Albert André (1869-1954) - Nature morte : pot blanc, bouteille, fruits Óleo sobre tela, 1908 Saint-Denis, Musée d'Art et d'Histoire
Uma boa iniciativa, pena que esta noite estivesse pouca gente na Alameda D. Afonso Henriques. E pena também não ter tido lugar (no meu estômago) para experimentar um dos muitos bolos com aspecto delicioso à venda na Festa.
No tempo tornado breve
a rosa se ficará
em fogo e não se queimando.
Impenitente, o luar
será nosso espaço e espelho.
Uma menina perfeita
ficará pelo artelho
de pés perf´dias andando.
(Ai que doçoso arrebol
nos rebola para o seio!)
Língua seca sobreveio
em dia de futebol.
Pedro Tamen In: Tábua das matérias. Sintra: Tertúlia, 1991, p. 95
A esfera desce
do espaço xxxveloz
ele a apara
no peito
e a pára
no ar xxxdepois
com o joelho
a dispõe a meia altura
onde
iluminada
a esfera xxxespera
o chute que xxxnum relâmpago
a dispara xxxna direcção xxxdo nosso xxxcoração.
É mais uma exposição no meu "pequeno museu" preferido de Paris, o Jacquemart-André. Trata-se da mostra da parte espanhola da colecção Pérez Simón, pertencente a um milionário mexicano, e está organizada por temas ( religiosos, retratos, nús e paisagens ). Cronologicamente, vai de Greco a Dali, passando por Goya,Sorolla, Juan Gris, Picasso e Miró.
Este é o número de blogues chineses, considerável apesar da enorme população da República Popular. Diz o South China Morning Post que, de acordo com as suas fontes, 95% dos blogues chineses são censurados,sendo o resultado mais palpável o facto de que todos os dias desaparecem misteriosamente posts, de forma alheia à vontade dos respectivos autores... Um big big brother...
Dizia ela muitas vezes, quando perguntada sobre o facto de lidar mal com a solidão, querer sempre gente à sua volta. Eu já conhecia esta frase de Amália, mas voltei a ouvi-la há duas noites atrás num excelente documentário, Amália Amá-la , que passou na RTP Memória.
«Cid foi malcriado e panfletário, obsessivo e impiedoso, mas acima de tudo lúcido, acutilante e divertido.» (João Paulo Cotrim - Cid. Lisboa: Assírio & Alvim, 2010, p. 17)
A propósito da publicação de um álbum sobre a obra de Cid.
Por vezes ficamos pasmados com o que vimos e lemos.
Abriu hoje, em Lisboa, a exposição Obras de Santa Engrácia : O Panteão na República. A Exposição está bonita e bem apresentada. Fiquei a saber, entre muitas e muitas outras coisas, que o órgão barroco que se encontra na capela-mor é o antigo órgão da Sé de Lisboa.
Como o Panteão Nacional recebe muitos visitantes estrangeiros resolveu a organização, e bem, colocar explicações em inglês. Pena é que algumas traduções sejam tão más, tão más, que até eu (que não gosto nada de inglês e sei pouco) dou pelos gatos. Alguns dos erros foram emendados no catálogo (este foi).
Reparem apenas neste mimo:
Testamento da Infanta D. Maria Treslado do testamento da infanta D. Maria, filha de D. Manuel, em 1577. Reservados, Cod. 6900, §23, BNP
Will of Infanta Dona Maria Facsimile of the will of infanta Dona Maria, daughter of D. Manuel, in 1577. Copyright edition, Cod. 6900, §23, BNP
Antoni Gaudí nasceu a 25 de Junho de 1852. Gosto sobremaneira de todas as suas obras, sendo as mais emblemáticas, na minha perspectiva, a Sagrada Família e o Parque Güell (Barcelona). A sua obra insere-se na Arte Nova. Gaudí utilizou nas suas construções o bizarro, um gosto pela consonância gótica aliado a elementos mouriscos e naturalistas. Já há uns tempos aqui foqei este arquitecto.
Pelos campos do mundo senha e signo ele não desiste e nunca se repete e em cada rua é um menino de camisola número sete. Pelos campos do mundo seu nome é quem nos diz ele corre e finta e dribla e com seus pés pelos campos do mundo escreve outro destino por isso diz-se Figo e é um país com ele o sonho é português.
Ontem um terço do Prosimetron foi às sardinhas - estavam fracas! -, a Alfama. No final do jantar, nós e os restantes comensais do largo fomos brindados (se assim se pode dizer) com «um par de fados», um dos quais rezava assim:
«Tomá lá que esta é para ti Toma lá que te dou eu Se não sabes cantar aqui Vai lá cantar pró Coliseu.»
Mas o espontâneo (que estava bastante alegre, como se pode depreender) não arredava pé...
«A vida de Carolina espelha, até pela sua curta viagem, um esplendor harmonioso, perceptível por entre as convicções que a animam, pela expressão dos seus actos, das palavras proferidas, àquelas que ficaram por dizer. O mesmo se poderá dizer das imagens dadas, capturadas ou talvez só imaginadas, mas que foram eternizadas, aqui e além fronteiras. Premonitória, ou não, pois sabemo-la dotada de uma lucidez invejável, expressa a sua vontade para que se cumprisse na morte o seu desejo em vida: "Encham tudo de plantas verdes ..." como se pelas plantas viçosas se antevisse a passagem para a vida dos lendários vales verdejantes e imortais, dos que perseguindo um sonho, alcançaram a sua pedra filosofal, vencendo o tempo, pois que morrem sem ter nunca envelhecido. Quisera ter escrito mais, confessa. E por entre esse desabafo sentimo-la mais perto, sempre que reflectimos na sua caminhada, revisitamos os seus textos, lembramos os seus passos. Mulher, alquimista doutros tempos, com segredos por revelar e mistérios indecifráveis. Breve, porém intensa ... uma vida em que coube o amor, a partilha, a entrega, a devoção, a vocação, o sacrifício e a dor. A par da luta por causas maiores torna-se promotora e mensageira da paz, sara corpos assolados por males, que em si não alcança curar! Foram breves em demasia as poucas primaveras experimentadas, mas por certo seivas tornadas brisas refrescantes na busca de uma paz, que o mundo foi pequeno demais para abraçar. «Propomos-lhe então um tempo de deleite, sugerindo que ao percorrer a exposição, permita ao seu olhar prender-se ... nos símbolos, objectos, imagens e palavras escolhidos, e uma vez implicados os sentidos, cem anos depois, nas intersecções dos sentidos, pressentir a vida que ainda vive!» (Isabel Lousada)
Oka-fu, A Sketch Book of Sakura, cherry blossom, is the most famous flower of Japan. Its beauty has long been inspiring artists in Japan Taizan-fuku
No século XX, os jovens kamikaze, pilotos dos aviões-suicidas, despedem-se assim poeticamente da vida, antes da sua partida sem regresso. Eis como fala em 1945 um piloto de vinte dois anos.
x
Se ao menos pudéssemos cair
Como as flores da cerejeira,
Tão puras e luminosas...
x Marguerite Yourcenar, O Tempo esse grande Escultor, Lisboa: Difel, 2001, p.65
A um passe de Didi, Garrincha avança Colado o couro aos pés, o olhar atento Dribla um, dribla dois, depois descansa Como a medir o lance do momento.
Vem-lhe o pressentimento; ele se lança Mais rápido que o próprio pensamento Dribla mais um, mais dois; a bola trança Feliz, entre seus pés - um pé-de-vento!
Num só transporte a multidão contrita Em ato de morte se levanta e grita Seu uníssono canto de esperança.
Garrincha, o anjo, escuta e atende: - Goooool! É pura imagem: um G que chuta um o Dentro da meta, um 1. É pura dança!
Vinicius de Moraes
Crónica de Carlos Drummond de Andrade, publicada em 22 Jan. 1983, dois dias após a morte de Garrincha.
MANÉ E O SONHO
A necessidade brasileira de esquecer os problemas agudos do país, difíceis de encarar, ou pelo menos de suavizá-los com uma cota de despreocupação e alegria, fez com que o futebol se tornasse a felicidade do povo. Pobres e ricos param de pensar para se encantar com ele. E os grandes jogadores convertem-se numa espécie de irmãos da gente, que detestamos ou amamos na medida em que nos frustram ou nos proporcionam o prazer de um espectáculo de 90 minutos, prolongado indefinidamente nas conversas e mesmo na solidão da lembrança. Mané Garrincha foi um desses ídolos providenciais com que o acaso veio ao encontro das massas populares e até dos figurões responsáveis periódicos pela sorte do Brasil, ofertando-lhes o jogador que contrariava todos os princípios sacramentais do jogo, e que no entanto alcançava os mais deliciosos resultados. Não seria mesmo uma indicação de que o país, despreparado para o destino glorioso que ambicionamos, também conseguiria vencer suas limitações e deficiências e chegar ao ponto de grandeza que nos daria individualmente o maior orgulho, pela extinção de antigos complexos nacionais? Interrogação que certamente não aflorava ao nível da consciência, mas que podia muito bem instalar-se no subterrâneo do espírito de cada patrício inquieto e insatisfeito consigo mesmo, e mais ainda com o geral da vida. Garrincha, em sua irresponsabilidade amável, poderia, quem sabe?, fornecer-nos a chave de um segredo de que era possuidor e que ele mesmo não decifrava, inocente que era da origem do poder mágico de seus músculos e pés. Divertido, espontâneo, inconsequente, com uma inocência que não excluía espertezas instintivas de Macunaíma – nenhum modelo seria mais adequado do que esse, para seduzir um povo que, olhando em redor, não encontrava os sérios heróis, os santos miraculosos de que necessita no dia-a-dia. A identificação da sociedade com ele fazia-se naturalmente. Garrincha não pedia nada a seus admiradores; não lhes exigia sacrifícios ou esforços mentais para admirá-lo e segui-lo, pois de resto não queria que ninguém o seguisse. Carregava nas costas um peso alegre, dispensando-nos de fazer o mesmo. Sua ambição ou projeto de vida (se é que, em matéria de Garrincha, se pode falar em projeto) consistia no papo de botequim, nos prazeres da cama, de que resultasse o prazer de novos filhos, no descompromisso, afinal, com os valores burgueses da vida. Não sou dos que acusam dirigentes do esporte, clubes, autoridades civis e torcedores em geral, de ingratidão para com Garrincha. Na própria essência do futebol profissional se instalam a ingratidão e a injustiça. O jogador só vale enquanto joga, e se jogar o fino. Não lhe perdoam a hora sem inspiração, a traiçoeira indecisão de um segundo, a influência de problemas pessoais sobre o comportamento na partida. É pago para deslumbrar a arquibancada e a cadeira importante, para nos desanuviar a alma, para nos consolar dos nossos malogros, para encobrir as amarguras da Nação. Ele julga que entrou em campo a fim de defender o seu sustento, mas seu negócio principal será defender milhões de angustiados presentes e ausentes contra seus fantasmas particulares ou colectivos. Garrincha foi um entre muitos desses infelizes, dos quais só se salva um ou outro predestinado, de estrela na testa, como Pelé. A simpatia nacional envolveu Mané em todos os lances de sua vida, por mais desajustada que fosse, e isso já é alguma coisa que nos livra de ter remorso pelo seu final triste. A criança grande que ele não deixou de ser foi vitimada pelo germe de autodestruição que trazia consigo: faltavam-lhe defesas psicológicas que acudissem ao apelo de amigos e fãs. Garrincha, o encantador, era folha ao vento. Resta a maravilhosa lembrança de suas incríveis habilidades, que farão sempre sorrir a quem as recordar. Basta ver um filme dos jogos que ele disputou: sente-se logo como o corpo humano pode ser instrumento das mais graciosas criações no espaço, rápidas como o relâmpago e duradouras na memória. Quem viu Garrincha atuar não pode levar a sério teorias científicas que prevêem a parábola inevitável de uma bola e asseguram a vitória – que não acontece. Se há um deus que regula o futebol, esse deus é sobretudo irónico e farsante, e Garrincha foi um de seus delegados incumbidos de zombar de tudo e de todos, nos estádios. Mas como é também um deus cruel, tirou do estonteante Garrincha a faculdade de perceber sua condição de agente divino. Foi um pobre e pequeno mortal que ajudou um país inteiro a sublimar suas tristezas. O pior é que as tristezas voltam, e não há outro Garrincha disponível. Precisa-se de um novo, que nos alimente o sonho.
ele tinha a perna torta perna troncha, distorcida perna errada, perna virada invertida, dobrada, partida
era como fosse uma perna por uma bala atingida mas a bala que é a morte ele a transformara em vida
e virava a bala em bala de chupar, multicolorida ou virava a bala em bola elétrica, trica, divertida
Marco Polo Guimarães (1948-)
Os meus colegas de blogue devem estar de boca aberta. Não percebo nada de futebol, mas como já disse aqui uma vez, acerca da biografia que Rui Castro dedicou a Garrincha, fico fascinada a ver este homem jogar.
Inaugura amanhã, dia 24 Jun., 18h30, no Panteão Nacional.
Há anos que procuro um livro sobre esta pintora que é fraquíssima, mas que me fascina. Desde que vi o filme Carrington, com uma bela música de Michael Nyman.
Um destes voltarei a ela, a propósito de Lytton Strachey.
Eugénio de Andrade traduziu os poemas e fragmenntos de Safo que apelido de "minimalista". A simplicidade de um poema (verso) com o simbolismo sonhador de Chagall.
A 22 de Junho de 1969 morria na sua casa de Londres, vítima de uma overdose de barbitúricos, Judy Garland. Tinha apenas 47 anos, e no entanto alcançara já a imortalidade.
O que é tragico nos ansiosos é que eles têm sempre razões para o serem.
- Henry de Montherlant
Esta convocação de Montherlant é um mea culpa que faço. Quando ajuízo e reprovo a ansiedade dos outros, como ontem fiz com um amigo, esqueço-me, como diz Montherlant, que existem razões para essa ansiedade que nos perturba, nos incomoda, nos aborrece. Mesmo quando não as conhecemos ou temos presentes.
Futebol se joga no estádio? Futebol se joga na praia, futebol se joga na rua, futebol se joga na alma. A bola é a mesma, forma sacra para craques e pernas-de-pau. Mesma a volúpia de chutar Na delirante copa-mundo ou no árido espaço do morro. São voos de estátuas súbitas desenhos feéricos, bailados de pés e troncos entrançados.
Instantes lúdicos: flutua o jogador, gravado no ar – afinal, o corpo triunfante da triste lei da gravidade.
Hoje vamos até às melancias. Há uma quantidade enorme de naturezas-mortas, nas quais a melancia se encontra representada. Escolhi cinco. Comi no domingo e estava óptima.
Sarah Miriam Peale (1800-1885) - Still life with watermelon Óleo sobre tela, 1822 Harvard Art Museum/Fogg Museum
Thomas Wightman (1811–1888) - Still life Óleo sobre tela, 1861 Augusta (Georgia, USA), Morris Museum of Art
Estêvão Silva (ca 1844-1891) - Natureza-morta Óleo sobre tela, 1884 São Paulo, col. Reginaldo Bertolino
Frida Kahlo - Viva la vida, 1954
James Aponovich (1948-) - Still life with watermelon Óleo sobre tela, 2005 Nova Iorque, David B. Findlay Jr. Gallery