Prosimetron

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sábado, 26 de junho de 2010

O Futebol nas Letras (para a infância) - 6


«Todas as tardes, quando saía da escola, Pinóquio entretinha-se a ver os seus companheiros aos pontapés à bola de trapos e ria a bom rir com os encontrões que eles davam uns nos outros, o que, muitas vezes, originava quedas aparatosas e zangas entre os jogadores que, ao chegarem a casa com os fatos rasgados, o calçado estropeado, e as mãos, as pernas e as caras esfoladas, recebiam de seus pais o devido correctivo» assim começa o livro de José Rosado, Pinóquio joga à bola (des. de Amorim. Lisboa: Romano Torres, 1957), da colecção Manecas.


Lisboa: Vega, 1991
«Dez anos depois, João, Raul e José Francisco encontraram-se no Aeroporto de Lisboa, num dia de grande movimento, com jornalistas e fotógrafos por toda a parte: entrevistas para a Rádio e para a Televisão. Ia partir para o Brasil a selecção de futebol e João, o guarda-redes, era o jogador mais procurado pelos repórteres. Ia ter a sua estreia internacional. Acabara de fazer vinte anos apenas, mas tinha revelado já uma classe tal que perfeitamente justificava a escolha do seleccionador.» (p. 67)

Lisboa: Vega, 1991
«Bola: É o primeiro brinquedo da criança, uma coisa mesmo a jeito para ser jogada; dá satisfação mexer-lhe com as mãos, com os pés, com a cabeça. Todos devemos ter direiro de jogar à bola, desde criança até todas as idades. A bola não tem idade, não tem bicos, não tem preferências, é igual para todos; é o jogo perfeito. Diz-se que a bola é redonda e são onze de cada lado e, com isso, quer-se dizer... isso mesmo. Que ela não terá favoritismos para uns ou para outros, que é imparcial, que está ali para ser jogada e que quem a jogar melhor deverá ser o vencedor do jogo. Sendo a bola assim tão prestável, tão amiga, tão colaborante, devemos tratá-la bem, com jeito, com habilidade... Os brasileiros até lhe chamam a "menina"...
Carlos Pinhão - «Futebol de A a Z. In: Abril Futebol Clube, p. 88

Amity


Bernard Fleetwood-Walker (1893-1965) - Amity
Óleo sobre tela, 1933
The Walker Art Gallery, National Museums Liverpool

Frutas - 15


Albert André (1869-1954) - Taça de peras, pão e um copo sobre a mesa
Boston, Museum of Fine Arts


Albert André (1869-1954) - Nature morte : pot blanc, bouteille, fruits
Óleo sobre tela, 1908
Saint-Denis, Musée d'Art et d'Histoire

Uma boa iniciativa, pena que esta noite estivesse pouca gente na Alameda D. Afonso Henriques. E pena também não ter tido lugar (no meu estômago) para experimentar um dos muitos bolos com aspecto delicioso à venda na Festa.

Mar...

Pierre-Auguste Renoir, Jeune garçon sur la plage d`Yport , 1883

The Barnes Foundation, Merion, Pennsylvania


MOSTRAI-ME AS ANÉMONAS

Mostrai-me as anémonas, as medusas e os corais
Do fundo do mar.
Eu nasci há um instante.


Sophia de Mello Breyner Andresen, Mar, Lisboa: Caminho, 2001, p.21

sexta-feira, 25 de junho de 2010

Em Paris, há 100 anos...


Léon Bakst - desenho de trajo para o bailado Pássaro de Fogo, que os Ballets Russes estrearam faz hoje 100 anos.
Paris, BnF

O Futebol nas Letras - 5

FUTEBOL

No tempo tornado breve
a rosa se ficará
em fogo e não se queimando.
Impenitente, o luar
será nosso espaço e espelho.
Uma menina perfeita
ficará pelo artelho
de pés perf´dias andando.
(Ai que doçoso arrebol
nos rebola para o seio!)

Língua seca sobreveio
em dia de futebol.

Pedro Tamen
In: Tábua das matérias. Sintra: Tertúlia, 1991, p. 95


https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEizRCxXt-I9_JK4QHKlObnKN6ilroIWEPWsLRE2-iysqLiyLFn-nXRzXDyaTGBDopYWeOaT1RZ5erDChTmbO5tkAE4Mn2MyJ6_UHBe4im_NAT76eABR6cWEN7K2zkYdmZAbf6bNcXkc6n45/s768/futebol.jpg

O GOL

A esfera desce
do espaço
xxxveloz
ele a apara
no peito
e a pára
no ar
xxxdepois
com o joelho
a dispõe a meia altura
onde
iluminada
a esfera
xxxespera
o chute que
xxxnum relâmpago
a dispara
xxxna direcção
xxxdo nosso
xxxcoração.

Ferreira Gular
(retirado da net)

FORÇA PORTUGAL!

O fado vai até ao Rio...

Portugal / Brasil. Como será esta sexta-feira? Será que vai ser festa para os dois?

"O fado é bom pra xuxu!"

Boa tarde!

Que começa aqui no Prosimetron com Maxwell e a sua voz de anjo.

Lá fora - 78 : Pintura espanhola em Paris


É mais uma exposição no meu "pequeno museu" preferido de Paris, o Jacquemart-André. Trata-se da mostra da parte espanhola da colecção Pérez Simón, pertencente a um milionário mexicano, e está organizada por temas ( religiosos, retratos, nús e paisagens ). Cronologicamente, vai de Greco a Dali, passando por Goya,Sorolla, Juan Gris, Picasso e Miró.
Até 1 de Agosto.

Em português - 8

Porque Eugénia de Mello e Castro recebeu há dias a Medalha de Prata da Academia de Artes, Ciências e Letras de França, e eu gosto desta Asas.

Números - 18

220.000.000

Este é o número de blogues chineses, considerável apesar da enorme população da República Popular.
Diz o South China Morning Post que, de acordo com as suas fontes, 95% dos blogues chineses são censurados,sendo o resultado mais palpável o facto de que todos os dias desaparecem misteriosamente posts, de forma alheia à vontade dos respectivos autores...
Um big big brother...

Citações - 96 : Amália


Antes mal acompanhada do que só.
Dizia ela muitas vezes, quando perguntada sobre o facto de lidar mal com a solidão, querer sempre gente à sua volta. Eu já conhecia esta frase de Amália, mas voltei a ouvi-la há duas noites atrás num excelente documentário, Amália Amá-la , que passou na RTP Memória.

A Portuguesa em dia de Portugal - Brasil


Capa da partitura original de A Portuguesa, marcha patriótica,
tendo como fundo a bandeira nacional até 1910 e o sol resplandescente

Auto-retrato(s) - 54


Augusto Cid (1941-) - Auto-caricatura, 1990


Augusto Cid (1941-) - Auto-caricatura, 2004

«Cid foi malcriado e panfletário, obsessivo e impiedoso, mas acima de tudo lúcido, acutilante e divertido.»
(João Paulo Cotrim - Cid. Lisboa: Assírio & Alvim, 2010, p. 17)
A propósito da publicação de um álbum sobre a obra de Cid.

"Copyright edition"

Por vezes ficamos pasmados com o que vimos e lemos.

Abriu hoje, em Lisboa, a exposição Obras de Santa Engrácia : O Panteão na República. A Exposição está bonita e bem apresentada. Fiquei a saber, entre muitas e muitas outras coisas, que o órgão barroco que se encontra na capela-mor é o antigo órgão da Sé de Lisboa.

Como o Panteão Nacional recebe muitos visitantes estrangeiros resolveu a organização, e bem, colocar explicações em inglês. Pena é que algumas traduções sejam tão más, tão más, que até eu (que não gosto nada de inglês e sei pouco) dou pelos gatos. Alguns dos erros foram emendados no catálogo (este foi).

Reparem apenas neste mimo:

Testamento da Infanta D. Maria
Treslado do testamento da infanta D. Maria, filha de D. Manuel, em 1577.
Reservados, Cod. 6900, §23, BNP

Will of Infanta Dona Maria
Facsimile of the will of infanta Dona Maria, daughter of D. Manuel, in 1577.
Copyright edition, Cod. 6900, §23, BNP

Homenagem a Antoni Gaudí.

Antoni Gaudí nasceu a 25 de Junho de 1852. Gosto sobremaneira de todas as suas obras, sendo as mais emblemáticas, na minha perspectiva, a Sagrada Família e o Parque Güell (Barcelona). A sua obra insere-se na Arte Nova. Gaudí utilizou nas suas construções o bizarro, um gosto pela consonância gótica aliado a elementos mouriscos e naturalistas. Já há uns tempos aqui foqei este arquitecto.
Janela uma porta aberta para o mundo!
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Janela da Casa Batló, 1905-1907
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Notas retiradas do livro: Arte Nova de Klaus-Jürgen Sembach da Taschen editado em 1993.

Este fim-de-semana, no Jardim da Estrela


quinta-feira, 24 de junho de 2010

O Futebol nas Letras - 4



Pelos campos do mundo senha e signo
ele não desiste e nunca se repete
e em cada rua é um menino
de camisola número sete.
Pelos campos do mundo seu nome é quem nos diz
ele corre e finta e dribla e com seus pés
pelos campos do mundo escreve outro destino
por isso diz-se Figo e é um país
com ele o sonho é português.

Manuel Alegre
In: Expresso, Lisboa, 14 Jun. 2002

Frutas - 14


Christian Berentz (1658–1722)
Flores e fruta
Óleo sobre tela, 1689
São Petersburgo, Hermitage


Christian Berentz (1658–1722)
Flores, fruta com uma mulher apanhando uvas

Óleo sobre tela, 1689
Nápoles, Museo Nazionale di Capodimonte

Berentz de novo no Prosimetron; desta vez com grande variedade de frutas, e mais melancias.

Um espontâneo que nos quis brindar com «um par de fados»


Ontem um terço do Prosimetron foi às sardinhas - estavam fracas! -, a Alfama. No final do jantar, nós e os restantes comensais do largo fomos brindados (se assim se pode dizer) com «um par de fados», um dos quais rezava assim:

«Tomá lá que esta é para ti
Toma lá que te dou eu
Se não sabes cantar aqui
Vai lá cantar pró Coliseu.»

Mas o espontâneo (que estava bastante alegre, como se pode depreender) não arredava pé...

Carolina Beatriz Ângelo



«A vida de Carolina espelha, até pela sua curta viagem, um esplendor harmonioso, perceptível por entre as convicções que a animam, pela expressão dos seus actos, das palavras proferidas, àquelas que ficaram por dizer. O mesmo se poderá dizer das imagens dadas, capturadas ou talvez só imaginadas, mas que foram eternizadas, aqui e além fronteiras. Premonitória, ou não, pois sabemo-la dotada de uma lucidez invejável, expressa a sua vontade para que se cumprisse na morte o seu desejo em vida: "Encham tudo de plantas verdes ..." como se pelas plantas viçosas se antevisse a passagem para a vida dos lendários vales verdejantes e imortais, dos que perseguindo um sonho, alcançaram a sua pedra filosofal, vencendo o tempo, pois que morrem sem ter nunca envelhecido. Quisera ter escrito mais, confessa. E por entre esse desabafo sentimo-la mais perto, sempre que reflectimos na sua caminhada, revisitamos os seus textos, lembramos os seus passos. Mulher, alquimista doutros tempos, com segredos por revelar e mistérios indecifráveis. Breve, porém intensa ... uma vida em que coube o amor, a partilha, a entrega, a devoção, a vocação, o sacrifício e a dor. A par da luta por causas maiores torna-se promotora e mensageira da paz, sara corpos assolados por males, que em si não alcança curar! Foram breves em demasia as poucas primaveras experimentadas, mas por certo seivas tornadas brisas refrescantes na busca de uma paz, que o mundo foi pequeno demais para abraçar.
«Propomos-lhe então um tempo de deleite, sugerindo que ao percorrer a exposição, permita ao seu olhar prender-se ... nos símbolos, objectos, imagens e palavras escolhidos, e uma vez implicados os sentidos, cem anos depois, nas intersecções dos sentidos, pressentir a vida que ainda vive!» (Isabel Lousada)

Ó meu rico São João


© João Menéres
S. João Baptista, Barro das Irmãs Flores (Perpétua e Maria Inácia) , Estremoz

Ó meu rico S. João,
A tua capela cheira,
Cheira a cravos, cheira a rosas,
Cheira a flor de laranjeira.

Ó alegres raparigas,
Cantai as vossas cantigas
Com amor e devoção
Ao calor das fogueiras
Da noite de S. João.

(Cantiga)

A nobreza da derrota - Marguerite Yourcenar

Oka-fu, A Sketch Book of
Sakura, cherry blossom, is the most famous flower of Japan. Its beauty has long been inspiring artists in Japan
Taizan-fuku

No século XX, os jovens kamikaze, pilotos dos aviões-suicidas, despedem-se assim poeticamente da vida, antes da sua partida sem regresso. Eis como fala em 1945 um piloto de vinte dois anos.
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Se ao menos pudéssemos cair
Como as flores da cerejeira,
Tão puras e luminosas...
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Marguerite Yourcenar, O Tempo esse grande Escultor, Lisboa: Difel, 2001, p.65

quarta-feira, 23 de junho de 2010

São João Bonito


Guilherme Camarinha (1912-1994) - A festa de S. João
Aguarela que serviu para uma tapeçaria executada pelas Tapeçarias de Portalegre para a Câmara Municpal do Porto

Ó meu São João Bonito,
bem bonito que ele é
Bem bonito que ele é
Com os seus caracóis de oiro, e seu cordeirinho ao pé
E seu cordeirinho ao pé
Não há nenhum assim, pelo menos para mim
Nem mesmo São José
Santo António já se acabou
O São Pedro está-se acabar
São João, São João
Dá cá um balão
Para eu brincar
Ó meu São João bonito, dos milagres sem igual
Dos milagres sem igual
Vem trazer santa alegria, às gentes de Portugal
Às gentes de Portugal
Ouve a nossa canção, e livrai de todo o mal
Meu rico São João
Santo António já se acabou
O São Pedro está-se acabar
São João, São João
Dá cá um balão
Para eu brincar

(Canção do filme O Pátio das Cantigas, interpretada por Maria das Neves)

O S. João no Porto.

Dedico a música ao S. João (do Porto) e a todos os Joões deste blogue
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Um cartaz do S. João que achei graça!


Rui Veloso


Poemas - 10


Marginal é quem escreve à margem,
deixando branca a página
para que a paisagem passe
e deixe tudo claro à sua passagem


Marginal, escrever na entrelinha,
sem nunca saber direito
quem veio primeiro
o ovo ou a galinha


- Paulo Leminski
, Distraídos venceremos , São Paulo, Editora Brasiliense, 1983.

Noite de S. João

E o seu balão! Um dos elementos icónicos da Festa de S.João, especialmente na Invicta.

O Futebol nas Letras - 3


http://i.a.cnn.net/si/2008/writers/tim_vickery/01/22/garrincha/p1_garrincha_0122.jpg

O ANJO DAS PERNAS TORTAS

A Flávio Porto

A um passe de Didi, Garrincha avança
Colado o couro aos pés, o olhar atento
Dribla um, dribla dois, depois descansa
Como a medir o lance do momento.

Vem-lhe o pressentimento; ele se lança
Mais rápido que o próprio pensamento
Dribla mais um, mais dois; a bola trança
Feliz, entre seus pés - um pé-de-vento!

Num só transporte a multidão contrita
Em ato de morte se levanta e grita
Seu uníssono canto de esperança.

Garrincha, o anjo, escuta e atende: - Goooool!
É pura imagem: um G que chuta um o
Dentro da meta, um 1. É pura dança!

Vinicius de Moraes


Crónica de Carlos Drummond de Andrade, publicada em 22 Jan. 1983, dois dias após a morte de Garrincha.

MANÉ E O SONHO

A necessidade brasileira de esquecer os problemas agudos do país, difíceis de encarar, ou pelo menos de suavizá-los com uma cota de despreocupação e alegria, fez com que o futebol se tornasse a felicidade do povo. Pobres e ricos param de pensar para se encantar com ele. E os grandes jogadores convertem-se numa espécie de irmãos da gente, que detestamos ou amamos na medida em que nos frustram ou nos proporcionam o prazer de um espectáculo de 90 minutos, prolongado indefinidamente nas conversas e mesmo na solidão da lembrança.
Mané Garrincha foi um desses ídolos providenciais com que o acaso veio ao encontro das massas populares e até dos figurões responsáveis periódicos pela sorte do Brasil, ofertando-lhes o jogador que contrariava todos os princípios sacramentais do jogo, e que no entanto alcançava os mais deliciosos resultados. Não seria mesmo uma indicação de que o país, despreparado para o destino glorioso que ambicionamos, também conseguiria vencer suas limitações e deficiências e chegar ao ponto de grandeza que nos daria individualmente o maior orgulho, pela extinção de antigos complexos nacionais? Interrogação que certamente não aflorava ao nível da consciência, mas que podia muito bem instalar-se no subterrâneo do espírito de cada patrício inquieto e insatisfeito consigo mesmo, e mais ainda com o geral da vida.
Garrincha, em sua irresponsabilidade amável, poderia, quem sabe?, fornecer-nos a chave de um segredo de que era possuidor e que ele mesmo não decifrava, inocente que era da origem do poder mágico de seus músculos e pés. Divertido, espontâneo, inconsequente, com uma inocência que não excluía espertezas instintivas de Macunaíma – nenhum modelo seria mais adequado do que esse, para seduzir um povo que, olhando em redor, não encontrava os sérios heróis, os santos miraculosos de que necessita no dia-a-dia. A identificação da sociedade com ele fazia-se naturalmente. Garrincha não pedia nada a seus admiradores; não lhes exigia sacrifícios ou esforços mentais para admirá-lo e segui-lo, pois de resto não queria que ninguém o seguisse. Carregava nas costas um peso alegre, dispensando-nos de fazer o mesmo. Sua ambição ou projeto de vida (se é que, em matéria de Garrincha, se pode falar em projeto) consistia no papo de botequim, nos prazeres da cama, de que resultasse o prazer de novos filhos, no descompromisso, afinal, com os valores burgueses da vida.
Não sou dos que acusam dirigentes do esporte, clubes, autoridades civis e torcedores em geral, de ingratidão para com Garrincha. Na própria essência do futebol profissional se instalam a ingratidão e a injustiça. O jogador só vale enquanto joga, e se jogar o fino. Não lhe perdoam a hora sem inspiração, a traiçoeira indecisão de um segundo, a influência de problemas pessoais sobre o comportamento na partida. É pago para deslumbrar a arquibancada e a cadeira importante, para nos desanuviar a alma, para nos consolar dos nossos malogros, para encobrir as amarguras da Nação. Ele julga que entrou em campo a fim de defender o seu sustento, mas seu negócio principal será defender milhões de angustiados presentes e ausentes contra seus fantasmas particulares ou colectivos. Garrincha foi um entre muitos desses infelizes, dos quais só se salva um ou outro predestinado, de estrela na testa, como Pelé.
A simpatia nacional envolveu Mané em todos os lances de sua vida, por mais desajustada que fosse, e isso já é alguma coisa que nos livra de ter remorso pelo seu final triste. A criança grande que ele não deixou de ser foi vitimada pelo germe de autodestruição que trazia consigo: faltavam-lhe defesas psicológicas que acudissem ao apelo de amigos e fãs. Garrincha, o encantador, era folha ao vento. Resta a maravilhosa lembrança de suas incríveis habilidades, que farão sempre sorrir a quem as recordar. Basta ver um filme dos jogos que ele disputou: sente-se logo como o corpo humano pode ser instrumento das mais graciosas criações no espaço, rápidas como o relâmpago e duradouras na memória. Quem viu Garrincha atuar não pode levar a sério teorias científicas que prevêem a parábola inevitável de uma bola e asseguram a vitória – que não acontece.
Se há um deus que regula o futebol, esse deus é sobretudo irónico e farsante, e Garrincha foi um de seus delegados incumbidos de zombar de tudo e de todos, nos estádios. Mas como é também um deus cruel, tirou do estonteante Garrincha a faculdade de perceber sua condição de agente divino. Foi um pobre e pequeno mortal que ajudou um país inteiro a sublimar suas tristezas. O pior é que as tristezas voltam, e não há outro Garrincha disponível. Precisa-se de um novo, que nos alimente o sonho.

Carlos Drummond de Andrade
http://asclejr.blogspot.com/2009/02/mane-e-o-sonho-por-carlos-drummond-de.html


GARRINCHA

ele tinha a perna torta
perna troncha, distorcida
perna errada, perna virada
invertida, dobrada, partida

era como fosse uma perna
por uma bala atingida
mas a bala que é a morte
ele a transformara em vida

e virava a bala em bala
de chupar, multicolorida
ou virava a bala em bola
elétrica, trica, divertida

Marco Polo Guimarães (1948-)

Os meus colegas de blogue devem estar de boca aberta. Não percebo nada de futebol, mas como já disse aqui uma vez, acerca da biografia que Rui Castro dedicou a Garrincha, fico fascinada a ver este homem jogar.


Inaugura amanhã, dia 24 Jun., 18h30, no Panteão Nacional.

Sábado no Mercado de Campo de Ourique

Dora Carrington (1893-1932)


Farm at Watendlath, 1921


Tidmarsh Mill, 1918


Cattle by a pond, view from Ham Spray, 1930

Há anos que procuro um livro sobre esta pintora que é fraquíssima, mas que me fascina. Desde que vi o filme Carrington, com uma bela música de Michael Nyman.
Um destes voltarei a ela, a propósito de Lytton Strachey.



Nem sequer sonho tocar o céu.

Eugénio de Andrade traduziu os poemas e fragmenntos de Safo que apelido de "minimalista". A simplicidade de um poema (verso) com o simbolismo sonhador de Chagall.
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Marc Chagall, Equestrienne (L'écuyère). 1931.
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Oil on canvas. 100 x 80.8. Stedelijk Museum, Amsterdam, Netherlands.

Nem sequer sonho tocar o céu.

Eugénio de Andrade, Poemas e Fragmentos de Safo, Porto: Fundação Eugénio de Andrade, p.70, 1990

Safo nasceu em Eressona Ilha de Lesbos, em meados do século VII a. C. (p.12)

terça-feira, 22 de junho de 2010

1969 : Judy Garland

A 22 de Junho de 1969 morria na sua casa de Londres, vítima de uma overdose de barbitúricos, Judy Garland. Tinha apenas 47 anos, e no entanto alcançara já a imortalidade.

PENSAMENTO(S) - 129


O que é tragico nos ansiosos é que eles têm sempre razões para o serem.


- Henry de Montherlant


Esta convocação de Montherlant é um mea culpa que faço. Quando ajuízo e reprovo a ansiedade dos outros, como ontem fiz com um amigo, esqueço-me, como diz Montherlant, que existem razões para essa ansiedade que nos perturba, nos incomoda, nos aborrece. Mesmo quando não as conhecemos ou temos presentes.

O Futebol nas Letras - 2


Futebol se joga no estádio?
Futebol se joga na praia,
futebol se joga na rua,
futebol se joga na alma.
A bola é a mesma, forma sacra
para craques e pernas-de-pau.
Mesma a volúpia de chutar
Na delirante copa-mundo
ou no árido espaço do morro.
São voos de estátuas súbitas
desenhos feéricos, bailados
de pés e troncos entrançados.

Instantes lúdicos: flutua
o jogador, gravado no ar
– afinal, o corpo triunfante
da triste lei da gravidade.

Carlos Drummond de Andrade

E quem foi (ou vai) à procura de um sorvete de melancia...


https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhxNifRkhpuJF18jWd7F7ibnTfgg5CH98Zj5oAK6mY7dSjnQrBXEgF2kgUnxQFYG1c4LA0rMTzL7bTpzuSSluTM6rMJ0By6ZFYdjozXd8raq0XhLIACjV6jPgOvAwmv-ush_bSqrlt5ghjn/s1600-h/IMG_5712.jpg
Encontrou?...

Quinta-feira...


Asno em capa de letrado

Procurava uma imagem e encontrei este ditado, ilustrado, que não conhecia. Aqui fica completamente roubado. Imagem e ditado:

"Anda em capa de letrado muito asno disfarçado"

artista: Paulo Medeiros

Frutas - 13

Hoje vamos até às melancias. Há uma quantidade enorme de naturezas-mortas, nas quais a melancia se encontra representada. Escolhi cinco.
Comi no domingo e estava óptima.


Sarah Miriam Peale (1800-1885) - Still life with watermelon
Óleo sobre tela, 1822
Harvard Art Museum/Fogg Museum


Thomas Wightman (1811–1888) - Still life
Óleo sobre tela, 1861
Augusta (Georgia, USA), Morris Museum of Art



Estêvão Silva (ca 1844-1891) - Natureza-morta
Óleo sobre tela, 1884
São Paulo, col. Reginaldo Bertolino



Frida Kahlo - Viva la vida, 1954


James Aponovich (1948-) - Still life with watermelon
Óleo sobre tela, 2005
Nova Iorque, David B. Findlay Jr. Gallery

Um azulejo andaluz


Com um agradecimento à Tecla Portela Carreiro.