«Madrid, Aranda de Duero, Burgos… Nos dias seguintes, já
mais familiarizado com os mapas e guias de caminhos do século XVIII, estabeleci
com mais precisão o itinerário dos dois académicos, calculando as estalagens e
as postas, as distâncias em léguas entre uma e outra. Depois levei tudo para o
mapa de Tomás López, e por último para um guia moderno de estradas. A maior
parte das rotas atuais coincidia com as antigas estradas e autoestradas de
sentido duplo tinham vindo a substituir os velhos caminhos de roda e ferradura,
mas quase sempre o traçado era o mesmo. Verifiquei, além disso, que algumas
estradas secundárias se mantinham fiéis aos antigos caminhos, delimitadas pelos
mesmos topónimos que figuravam nos guias setecentistas […].»
«Ainda havia sol quando, ao entardecer, me sentei à mesa de
uma esplanada na Plaza Mayor de Aranda de Duero. Pedi um café, abri alguns
livros e um mapa do que levava na minha bolsa de viagem, e verifiquei que até
ali tudo coincidia com os guias dos caminhos de setecentos […].
«A praça principal de Aranda tinha mudado muito durante os
mais de dois séculos decorridos desde a viagem dos académicos; mas conservava o
seu traçado original, alguns edifícios da época e boa parte das velhas arcadas
sob as quais naquela noite de regresso da câmara, caminhavam don Pedro Zárate e
o jovem Quiroga quando se cruzaram, sem o conhecer, com Pascual Raposo. Agora
eu precisava de definir o ambiente adequado para recriar uma cena interior, de
jantar amistoso e conversa agradável entre o almirante, don Hermógenes, e viúva
e o seu filho. Qualquer dos bares ou restaurantes próximos podia encontrar-se
no mesmo lugar ocupado pela hospedaria estrecha e a estalagem trabajosa,
palavras que no século XVIII eram sinónimos de mal organizado, pobre ou miserável.»
«Cidades, hotéis, paisagens, adquirem um caráter singular
quando alguém se aproxima deles com leituras prévias na cabeça. Muda muito as
coisas, nesse sentido, percorrer a Mancha com o Dom Quixote nas mãos, visitar
Palermo tendo lido O Leopardo, passear por Buenos Aires com Borges ou Bioy
Casares na lembrança, ou caminhar por Hisarlik sabendo que houve ali uma cidade
chamada Troia, e que os sapatos do viajante levam o mesmo pó pelo qual Aquiles
arrastou o cadáver de Heitor atado ao seu carro.»
Arturo Pérez-Reverte - Bons amigos. Trad. Cristina Rodriguez, Artur Guerra. Alfragide: Asa, 2016, p. 93, 114, 129
Bailava-se nas tabernas espanholas no século XVIII.
6 comentários:
A "Fastigimia", de Tomé Pinheiro da Veiga, se calhar não é conhecida de Revertye...
Bom dia!
Quis dizer:
Reverte.
Não sei. Até agora não o referiu.
mas também a Fastigimia, de que só li partes, é o relato de uma viagem de Lisboa a Valhadolide. Este romance trata de uma viagem de Madrid a Paris. Agora já estou em Paris: eu, os académicos e mais uns quantos personagens. :)
Bom dia!
Já se dançou assim talqualmente, no século XX e no folclore português. E talvez inda se dance.
Não tinha pensado na hipótese de haver viajens e visitas a rememorar leituras e factos passados, imagino que tudo seja outra coisa. Mas prefiro ver os lugares com meus olhos primeiros.
Sempre que ouvi e vi bailar esta jota , foi em Portugal ou por " grupos " portugueses.
Boa tarde!
Bea,
Também achei que havia muito desta música como da dança no nosso folclore.
Não deixa de ter graça, Luisa!
Bom dia às duas.
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