Desejando boa noite de Reis a todos (dado o adiantado da hora), aqui deixo as armas que tradicionalmente se atribuem aos próprios, nos armoriais medievais e naqueles que posteriormente recolheram o seu conteúdo.
Escolhi uma página da 1.ª edição, de 1483, da Crónica do Concílio de Constança, de Ulrich von Richental.
A heráldica, enquanto ciência, incide sobre determinados usos enquanto fenómenos históricos, sociais e culturais. Neste âmbito, a chamada heráldica imaginária, ou seja, a atribuição do uso de armas a personalidades meramente literárias ou míticas, a pessoas que viveram em tempos pré-heráldicos ou a outros que, manifestamente não fazendo uso de símbolos heráldicos, os viram atribuídos “oficiosamente”, tem um especial interesse e encanto, pelos laços passíveis de se estabelecer entre significante e significado, as mais das vezes desconhecidos e impossíveis de determinar na heráldica “real”.
Com variantes, que as houve, estes ordenamentos, baseados em estrelas, no conjunto estrela-crescente e num exotismo evidente (o uso da figura humana é excepcionalíssimo, a que acresce o carácter selvagem da mesma, por vezes com vestes artisticamente rasgadas ou ornando-se a flâmula com um dragão), são também um meio que a “Idade Média” tem de nos mostrar de que modo vivia a Epifania e o seu significado.
Repito agora um detalhe do quadro de Gregório Lopes, do MNAA. As armas aqui atribuídas aos Reis Magos são diferentes. Não garantindo os esmaltes, quer pelo suporte, quer pela qualidade da fotografia, a primeira bandeira apresenta uma águia bastante estilizada, que seria talvez de vermelho, sobre campo branco (ou amarelo? NB: em objectos vexilares, os metais são substituídos por estas duas cores); no segundo caso temos um cortado de verde e branco; no terceiro caso um leão, de estilo muito semelhante ao da águia, de vermelho, sobre campo hipoteticamente amarelo.
Diversa fonte, seguramente, a de Gregório Lopes, correspondendo a uma igualmente diversa visão dos reis magos, pelo menos simbolicamente menos exótica. Os banais leão e águia, conjugados com uma partição das mais simples, são mais representativos da transição entre a heráldica viva e a heráldica “de papel”.
Para os interessados, recomendo a leitura de um artigo do Dr. Pedro Sameiro, publicado na revista Armas e Troféus de 1995.
8 comentários:
Sendo um leigo na matéria, gostei do seu post.
Achei extraordinária esta informação. Desconhecia que tinham sido atribuídas armas aos reis magos.
Idem.
Boa noite!
M.
Obrigado. Aprendi. E adoro aprender!
Sempre é o nosso heraldista-residente :)
Este é um tema muito interessante, sendo certo que até muitas personagens fora do "universo cristão" tiveram direito a armas.
Incluindo o próprio Satanás... :) Ainda bem que gostaram. Vou tentar não abusar... :)
Também? Podia "abusar", com essa do Santanás...
Combinado! Mas tenho que compensar, o Bem com o Mal, ou ainda pensam que sou membro da associação de que o Luís falou aqui há umas semanas... :)
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