Prosimetron

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sábado, 13 de junho de 2015

Tavira

Tavira, 30-31 maio 2015

Cheguei finalmente à vila da minha infância.
Desci do comboio, recordei-me, olhei, vi, comparei.
(Tudo isto levou o espaço de tempo de um olhar cansado).
Tudo é velho onde fui novo.
Desde já — outras lojas, e outras frontarias de pinturas nos mesmos prédios —
Um automóvel que nunca vi (não os havia antes)
Estagna amarelo escuro ante uma porta entreaberta.
Tudo é velho onde fui novo.
Sim, porque até o mais novo que eu é ser velho o resto.
A casa que pintaram de novo é mais velha porque a pintaram de novo.
Paro diante da paisagem, e o que vejo sou eu.
Outrora aqui antevi-me esplendoroso aos 40 anos — Senhor do mundo —
É aos 41 que desembarco do comboio [indolentão?].
O que conquistei? Nada.
Nada, aliás, tenho a valer conquistado.
Trago o meu tédio e a minha falência fisicamente no pesar-me mais a mala...
De repente avanço seguro, resolutamente.
Passou roda a minha hesitação
Esta vila da minha infância é afinal uma cidade estrangeira.
(Estou à vontade, como sempre, perante o estranho, o que me não é nada)
Sou forasteiro tourist, transeunte.
E claro: é isso que sou.
Até em mim, meu Deus, até em mim.

8-12-1931
Álvaro de Campos
In: Fernando Pessoa - Livro de Versos. Intr., transcr., org. e notas de Teresa Rita Lopes. Lisboa: Estampa, 1993

3 comentários:

APS disse...

A minha primeira impressão, que ficou, de Tavira, foi desagradável: intenso cheiro a maresia, ou pior, a esgotos..:-(
Bom feriado

MR disse...

Sempre gostei de Tavira, não me lembro de cheirar mal. Para mim é uma das poucas que se safam no Algarve. :)

Cheirar mal de se não aguentar, lembro-me das vezes que fui a Aveiro no verão há muitos anos. Era um horror. Nos últimos anos estive lá duas ou três vezes e já não cheira. E está uma cidade linda.

ana disse...

Acho também uma cidade gira. Nunca a vi com tanta água.
Boa tarde. :))