Pierre Bonnard - Janela, 1925
Tenho quarenta janelas,
nas paredes do meu quarto,
sem vidros nem bambinelas,
posso ver através delas,
o mundo em que me reparto.
Por uma entra a luz do sol,
por outra a luz do luar,
por outra a luz das estrelas,
que andam no céu a rolar.
Por esta entra a Via Láctea,
como um vapor de algodão,
por aquela a luz dos homens,
pela outra a escuridão.
Pela maior entra o espanto,
pela menor a certeza,
pela da frente a beleza,
que inunda de canto a canto.
Pela quadrada entra a esperança,
de quatro lados iguais,
quatro arestas, quatro vértices,
quatro pontos cardeais.
Pela redonda entra o sonho,
que as vigias são redondas,
e o sonho afaga e embala,
à semelhança das ondas.
Por além entra a tristeza,
por aquela entra a saudade,
e o desejo, e a humildade,
e o silêncio, e a surpresa.
E o amor dos homens, e o tédio,
e o medo, e a melancolia,
e essa fome sem remédio,
a que se chama poesia.
E a inocência, e a bondade,
e a dor própria, e a dor alheia,
e a paixão que se incendeia,
e a viuvez, e a piedade.
E o grande pássaro branco,
e o grande pássaro negro,
que se olham obliquamente,
arrepiados de medo.
Todos os risos e choros,
todas as fomes e sedes,
tudo alonga a sua sombra,
nas minhas quatro paredes.
Oh janelas do meu quarto,
que vos pudesse rasgar,
com tanta janela aberta,
falta-me a luz e o ar.
António Gedeão
Para a Ana.
6 comentários:
De novo: parabéns Ana. Não se pode deixar de gostar de uma janela com parapeito de calçada. E Gedeão é poeta que traz sempre muita coisa, os seus poemas chegam-nos carregados mas simples. E há sempre, em qualquer lado deles, uma réstea de desconsolo que aponta ao humano, espécie de compreensão triste da realidade.
Lindíssimo! Parabéns Ana!
Tão bonito!
Muito obrigada, MR.
Beijinho grato.:))
Obrigada,Bea!
:-) para o poema e a pintura.
Para Ana parabens!
Para todos, bon día.
Bom dia para todas.
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