Prosimetron

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sexta-feira, 26 de agosto de 2022

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Cão 

Cão passageiro, cão estrito, 
cão rasteiro cor de luva amarela, 
apara-lápis, fraldiqueiro, 
cão liquefeito, cão estafado, 
cão de gravata pendente, 
cão de orelhas engomadas, 
de remexido rabo ausente, 
cão ululante, cão coruscante, 
cão magro, tétrico, maldito, 
a desfazer-se num ganido,
a refazer-se num latido, 
cão disparado: cão aqui, 
cão além, e sempre cão. 
Cão marrado, preso a um fio de cheiro, 
cão a esburgar o osso 
essencial do dia a dia, 
cão estouvado de alegria, 
cão formal da poesia, 
cão-soneto de ão-ão bem martelado, 
cão moído de pancada 
e condoído do dono, 
cão: esfera do sono, 
cão de pura invenção, cão pré-fabricado, 
cão-espelho, cão-cinzeiro, cão-botija, 
cão de olhos que afligem, 
cão-problema… 

Sai depressa, ó cão, deste poema! 


No Dia do Cão.

7 comentários:

Pini disse...

No sabía que hoy era el día de perro.
Muy bonito el marcador y precioso poema.
Boa tarde

bea disse...

Tão bonito este poema de Alexandre O'Neill. "cão de olhos que afligem". E há tanta gente com olhos de cão, que afligem. Ou são, como os dos cães, de amor perpétuo e dedicado (os últimos são menos vistos).

MR disse...

O'Neill é um dos meus poetas, um dos que mais releio.
Boa tarde para os dois.

Justa disse...

¡Sin palabras!

Apertas desde Lugo con vacacións interrumpidas.

MR disse...

Bom sábado!

Margarida Elias disse...

«Cão marrado, preso a um fio de cheiro» - gostei sobretudo deste verso que me lembrou da minha cadela, que às vezes não sai do sítio a cheirar nem sei o quê. Gostei muito do poema. Bom dia!

MR disse...

«Sai depressa, ó cão, deste poema!» é um final mesmo à O'Neill: Mas que o cão não saia do quadro. 😉
Bom sábado!