Carmen Sylva, Rainha da Roménia Pauline Elisabeth Ottilie Luise zu Wied
BUCARESTE
(Carta a uma dama que me declarou um dia sua admiração por Cármen Sylva, rainha da Roménia).
Senhora,
Não me lembro onde foi, nem quando! Mas certamente Cármen Sylva acabava de publicar algum livro requintado, e Les Annales fizeram o retrato da rainha-poeta, e a senhora foi tocada pela simplicidade de seus atavios, pela delicadeza de seus cabelos grisalhos e de seus olhos acolhedores. E Les Annales proclamaram que a alma da artista ardia por trás dessa aparência modesta!
Mas eis que me vejo prestes a demolir seu ídolo, minha senhora, porque conheci o palácio onde ela brilha! Há-de conceder-me, não é mesmo? Que as paredes de uma morada reflectem a alma que a habita, e, considerando que julgo apenas pelo que meus olhos mostram, há-de perdoar-me, após ter lido isto.
Mas a senhora conhece El Greco! Exactamente: Domenikos Theotokopoulos. Um ressuscitado de três ou quatro anos. O milagre aconteceu no Salão de Outono de 1908. E foi uma alegria muito grande, para os amantes da arte, essa exposição retrospectiva e reabilitadora. Para os historiadores de arte, obstinados com os Murillo, os Zurbarán e os Velazquez, El Greco era um incidente cronológico nem assinalado. (…) a Senhora compreenderá que eu acreditava na excelência de Carmen Sylva, pois, ao transpor o limiar de sua morada, encontraria ali oito quadros do Greco pendurados nas paredes de seus quartos e de sua sala de música.
Não a fatigarei com a descrição desses quadros, mas, para ficar no assunto, tentarei falar-lhe dos seus enquadramentos. (…)
Subíamos a escada de honra do palácio de Cármen Sylva, custava-nos acreditar que estivéssemos na realidade. Era muito feio. Passamos Deus sabe lá quantas salas, na confusão das quais encontramos os Greco que procurávamos.
(a continuar…)
Le Corbusier, A Viagem do Oriente, São Paulo: Cosac Naify, 2007, (Apoio do Ministério da Cultura Francês - Centro Nacional do Livro, traduzido por Paulo Neves), p. 55-58
(Carta a uma dama que me declarou um dia sua admiração por Cármen Sylva, rainha da Roménia).
Senhora,
Não me lembro onde foi, nem quando! Mas certamente Cármen Sylva acabava de publicar algum livro requintado, e Les Annales fizeram o retrato da rainha-poeta, e a senhora foi tocada pela simplicidade de seus atavios, pela delicadeza de seus cabelos grisalhos e de seus olhos acolhedores. E Les Annales proclamaram que a alma da artista ardia por trás dessa aparência modesta!
Mas eis que me vejo prestes a demolir seu ídolo, minha senhora, porque conheci o palácio onde ela brilha! Há-de conceder-me, não é mesmo? Que as paredes de uma morada reflectem a alma que a habita, e, considerando que julgo apenas pelo que meus olhos mostram, há-de perdoar-me, após ter lido isto.
Mas a senhora conhece El Greco! Exactamente: Domenikos Theotokopoulos. Um ressuscitado de três ou quatro anos. O milagre aconteceu no Salão de Outono de 1908. E foi uma alegria muito grande, para os amantes da arte, essa exposição retrospectiva e reabilitadora. Para os historiadores de arte, obstinados com os Murillo, os Zurbarán e os Velazquez, El Greco era um incidente cronológico nem assinalado. (…) a Senhora compreenderá que eu acreditava na excelência de Carmen Sylva, pois, ao transpor o limiar de sua morada, encontraria ali oito quadros do Greco pendurados nas paredes de seus quartos e de sua sala de música.
Não a fatigarei com a descrição desses quadros, mas, para ficar no assunto, tentarei falar-lhe dos seus enquadramentos. (…)
Subíamos a escada de honra do palácio de Cármen Sylva, custava-nos acreditar que estivéssemos na realidade. Era muito feio. Passamos Deus sabe lá quantas salas, na confusão das quais encontramos os Greco que procurávamos.
(a continuar…)
Le Corbusier, A Viagem do Oriente, São Paulo: Cosac Naify, 2007, (Apoio do Ministério da Cultura Francês - Centro Nacional do Livro, traduzido por Paulo Neves), p. 55-58
2 comentários:
foi uma mulher interessante esta rainha-escritora da Romenia, mas na velhice tornou-se um pouco fantasiosa e caprichosa, que o diga a sua sucessora, Maria da Romenia, uma das rainhas mais belas do seculo XX, mae do Rei Carol que acabou exilado no Estoril.
Não contesto que a Rainha Elisabeth da Roménia era interessante. Andei a pesquisar e constatei que escreveu vários títulos e teve uma intensa vida intelectual a par com a sua condição de rainha. Os "Annales" também lhe teciam elogios, portanto, não refuto o seu valor. A imagem que está no excerto é o que dela pensava Le Corbusier um arquitecto voltado para a pureza das linhas e funcionalismo que caracterizou os anos 20. Não conheço o seu Palácio mas pelo que vi penso que Carbusier era capaz de ter alguma razão, mesmo olhando para os padrões da corte romena.
Enviar um comentário