Lisboa: Tinta da China, 2016
Meio intelectual, meio de esquerda reúne cerca de 80 crónicas de António Prata, um brasileiro nascido em 1977 que escreve na Folha de São Paulo, mas já foi cronista de O Estado de S. Paulo e da revista Capricho.
Estou a devorar estas crónicas, sempre divertidas. Um livro que não estava nos meus planos de leitura.
«Eu sou meio intelectual, meio de esquerda, por isso frequento bares meio ruins. Não sei se você sabe, mas nós, meio intelectuais, meio de esquerda, nos julgamos a vanguarda do proletariado, há mais de cento e cinquenta anos. […] No bar ruim que ando frequentando ultimamente o proletariado atende por Betão – é o garçom, que cumprimento com um tapinha nas costas, acreditando resolver aí quinhentos anos de história.» (in «Bar ruim é lindo, bicho», p. 41).
«Estou feliz e satisfeito. Se não tivesse que revisa esta crónica, até abriria uma cerveja: acabei de eliminar o último montinho da casa, o maior que me acompanhava há mais de um ano. Não sei se você, disciplinado leitor, também sofre desse mal - o montinho -, mas a minha vida é uma inútil e etern guerra contra eles.» (in «Caos e celulose», p. 71).
Eu sofro. E tenho passado uns dias de férias a lutar contra eles. São uns dos grandes infernos da minha vida: os montinhos.
«É inegável a simpatia da bicicleta. [...] Se Cervantes escrevesse hoje, Rocinente não seria pele e osso, mas quadro, guidão e pneus.» (in «Bicicleta!», p. 77).
«Estou feliz e satisfeito. Se não tivesse que revisa esta crónica, até abriria uma cerveja: acabei de eliminar o último montinho da casa, o maior que me acompanhava há mais de um ano. Não sei se você, disciplinado leitor, também sofre desse mal - o montinho -, mas a minha vida é uma inútil e etern guerra contra eles.» (in «Caos e celulose», p. 71).
Eu sofro. E tenho passado uns dias de férias a lutar contra eles. São uns dos grandes infernos da minha vida: os montinhos.
«É inegável a simpatia da bicicleta. [...] Se Cervantes escrevesse hoje, Rocinente não seria pele e osso, mas quadro, guidão e pneus.» (in «Bicicleta!», p. 77).
BALADA DAS MENINAS DE BICICLETA
Meninas de bicicleta
Que fagueiras pedalais
Quero ser vosso poeta!
Ó transitórias estátuas
Esfuziantes de azul
Louras com peles mulatas
Princesas da zona sul:
As vossas jovens figuras
Retesadas nos selins
Me prendem, com serem puras
Em redondilhas afins.
Que lindas são vossas quilhas
Quando as praias abordais!
E as nervosas panturrilhas
Na rotação dos pedais:
Que douradas maravilhas!
Bicicletai, meninada
Aos ventos do Arpoador
Solta a flâmula agitada
Das cabeleiras em flor
Uma correndo à gandaia
Outra com jeito de séria
Mostrando as pernas sem saia
Feitas da mesma matéria.
Permanecei! vós que sois
O que o mundo não tem mais
Juventude de maiôs
Sobre máquinas da paz
Enxames de namoradas
Ao sol de Copacabana
Centauresas transpiradas
Que o leque do mar abana!
A vós o canto que inflama
Os meus trint'anos, meninas
Velozes massas em chama
Explodindo em vitaminas.
Bem haja a vossa saúde
À humanidade inquieta
Vós cuja ardente virtude
Preservais muito amiúde
Com um selim de bicicleta
Vós que levais tantas raças
Nos corpos firmes e crus:
Meninas, soltai as alças
Bicicletai seios nus!
No vosso rastro persiste
O mesmo eterno poeta
Um poeta - essa coisa triste
Escravizada à beleza
Que em vosso rastro persiste,
Levando a sua tristeza
No quadro da bicicleta.
Rio de Janeiro, 1946
Vinicius de Moraes
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