SONETO
Eu cantarei de amor tão docemente,
Por uns termos em si tão concertados,
Que dois mil acidentes namorados
Faça sentir ao peito que não sente.
Farei que amor a todos avivente,
Pintando mil segredos delicados,
Brandas iras, suspiros magoados,
Temerosa ousadia e pena ausente.
Também, Senhora, do desprezo honesto
De vossa vista branda e rigorosa,
Contentar-me-ei dizendo a menor parte.
Porém, para cantar de vosso gesto
A composição alta e milagrosa
Aqui falta saber, engenho e arte.
Luís Vaz de Camões
(1524? -1580)
2 comentários:
Porque foi bom reler Camões, envio-lhe este:
Perdigão perdeu a pena
Cantiga alheia
Perdigão perdeu a pena,
não há mal que lhe não venha
Voltas
Perdigão, que o pensamento
subiu em alto lugar,
perde a pena do voar,
ganha a pena do tormento,
Nãotem no ar nem no vento
asas com que se sustenha:
não há mal que lhe não venha.
Quis voar a ua alta torre
mas achou-se desasado;
e, vendo-se depenado,
de puro penado morre.
Se a queixumes se socorre,
lança no fogo mais lenha:
não há mal que lhe não venha.
Luís Vaz de Camões in, Cem Poemas Portugueses do Riso e do Maldizer, Lisboa: Terramar, p. 19 e 20. (selecção de José Fanha e Jorge Letria)
A.R.
É sempre um imenso prazer voltar a Luís Vaz.
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