Prosimetron

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segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Bestiário-mistério

Painel de Azulejos: Bestiário, século XVII, Palácio Fronteira

Imagem retirada de Lisboa Livro de Bordo, p.50

"Longe, noutra Lisboa, São Domingos de Benfica, existe um bestiário-mistério guardado em palácio há mais de trezentos anos.Está envolvido em jardins e floresta na base da Serra do Monsanto e tem um aval de marqueses ilustrados a dar-lhes majestade. Palácio Fronteira, eis o lugar. (...) Pascal Guignard descreveu-o em corpo inteiro na novela «A Fronteira». Senhor de Jaume, de seu nome e, pelo que se sabe, entre assassino à traição e demónio das alcovas, não houve força que o travasse na sua cavalgada de sedutor. Os anjos libertinos cobriam-no com as suas asas protectoras, é um facto, mas, sádicos por devoção, num golpe de sarcasmo lançaram-no depois à desgraça e o cavaleiro acabou castrado pela única mulher dos seios vegetais.
Ponto final, não. Porque, só escarnecido, o garanhão castrado foi pedir clemência ao Senhor do palácio e logo ali recebeu abrigo até aos seus últimos dias. É nesse tempo de misericórdia que alguém de traço escarninho e jamais identificado desenhou não a tragédia do Cavaleiro de Jaume mas a sociedade que ele frequentou.
Lá a temos. é um fabulário de relações farsantes que está figurado nesses azulejos. ali as personagens humanas têm rostos de macacos compenetrados de sapiência e os animais assumem-se como humanos nas expressões e nas atitudes. Há gatos palacianos a estudar música com um mestre de solfejo e com umfrade de mono, e há outros em cadeira de barbeiro com um homem-símio aos pés. Num gabinete de curandeiro um bichano de bigodes austeros e olhos frios estendeuma pata à observação do físico que encobre toda a sua ignorância com um monóculo posto à pressa (...)"

José Cardoso Pires, Lisboa Livro de Bordo, Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1998, p.51-52.

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