Prosimetron

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quinta-feira, 22 de outubro de 2009

PARAÍSO : 7 - Madrugada

" O Quim morreu, o Quim morreu ". A cabeça de Pedro latejava, tanto como o motor do pequeno Smart que seguia rumo ao bairro. Apenas uma hora tinha passado desde que o Amílcar matara o Quim como nos filmes: com o cano da pistola encostado à nuca, no meio de uma conversa banal na sala de estar da casa da Ericeira.
Enquanto o Dread e o Zé cortavam um bocado da velha e carcomida alcatifa, agora empapada de sangue, para nela embrulharem o Quim, Amílcar explicara: " Este porco andava a roubar-me há meio ano, ele e o sacana do Vladimir tinham um esquema com dois gajos do Rafael. O cabrão do moldavo já está a servir de isco para os peixinhos, que é o mesmo que vai acontecer aqui ao nosso amigo Quim. Mas não te preocupes, sei que não estavas feito com eles e vou dar-te uma prova de confiança. "
A confiança de Amílcar passava pela recuperação do dinheiro de Quim. Não tendo este sequer conta bancária, o dinheiro tinha de estar guardado nalgum lado, muito provavelmente em casa da mãe com quem nunca deixara de viver.
Era esta a missão de Pedro: ir a Santa Filomena procurar o dinheiro que havia dado a morte a Quim.
Apesar da velocidade e da estrada deserta, o percurso entre a Ericeira e o bairro tinha parecido interminável, tal como a espera discreta junto à Torre C até que fossem cinco da manhã e a D.Ermelinda saísse de casa para apanhar o primeiro autocarro do dia rumo ao escritório de advogados onde fazia limpezas. Pedro viu-a finalmente sair do prédio, alheada do destino do seu único filho que estaria a esta hora a ser sepultado no Tejo com a ajuda de um saco de tijolos ou qualquer outra coisa pesada.
O palpite de Amílcar revelou-se acertado: entre o que tinha encontrado debaixo da cama, dentro de um falso livro na pequena estante e numa caixa de sapatos no roupeiro, Pedro contou 4800 euros que guardou num bolso interior da sua mochila.
Saiu rapidamente de S.Filomena, não queria ser visto nesta que era uma das horas de ponta do bairro em que as portas de vários prédios iam deixando sair mulheres a caminho de limpezas e homens a caminho de obras, ao mesmo tempo que a fauna nocturna regressava para o descanso.
Pedro não seguiu no entanto para a Ericeira, onde era esperado, mas sim em direcção ao Amadora-Sintra reiterando para si próprio o que havia decidido ao sair de casa de Amílcar: custasse o que custasse, não voltaria à mesma vida que tinha levado nos últimos meses.
Tinha de deixar Lisboa o mais rapidamente possível, mas não queria fazê-lo sem ao menos falar com Carina a quem tinha pedido que não saísse do hospital até que ele chegasse.
Ela esperava-o no local combinado, fora do recinto hospitalar, e foi ela que decidiu segui-lo, apesar das tíbias recusas de Pedro. Foi ela também quem decidiu usar a caixa multibanco do hospital para tirarem da sua conta o máximo possível, e foi ainda ela quem sugeriu a troca de carros: o Smart de Pedro ficaria perto do hospital e levariam o Clio dela.
Finalmente, foi Carina quem decidiu o local onde se iriam acolher.
Às sete e meia da manhã, Pedro e Carina atravessaram a Ponte 25 de Abril.

( cont. )

3 comentários:

MR disse...

Continua emocionante.

Anónimo disse...

O seu folhetim agarra-nos.
Ana

Miss Tolstoi disse...

Parabéns! e fico à espera do próximo.