Prosimetron

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quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Uma procura sem fim... ?


Quando conheci o Rogério, ele era um tranquilo católico apostólico romano da variedade praticante, com missa dominical, confissão e comunhão.
Uma certeza de vida que Dan Brown veio perturbar com o seu Código Da Vinci. O Rogério só então, como aliás muitos outros católicos e cristãos de outras filiações, tomou contacto com toda a literatura apócrifa dos primórdios do Cristianismo.
Foi uma fase de efervescência na vida do meu amigo, que durante meses só lia e falava de Nag Hammadi, dos Manuscritos do Mar Morto, dos Essénios e ainda mais obscuros outros grupos.
O que não tínhamos contado era que toda esta agitação o conduzisse como conduziu ao Judaísmo.
Começou então o Rogério a ler tudo o que encontrava sobre a religião mosaica e, para ainda maior surpresa nossa, a "infiltrar-se" na comunidade judaica de Lisboa. Passados longos meses, e quando o já o víamos, nas nossas conversas, pronto a abdicar de um certo pedaço de pele, nova revelação num aniversário de um amigo comum: " O Judaísmo é uma religião ultrapassada, para gente que vive no deserto, só regras absurdas, já leram o Levítico? " Assim falou, não Zaratustra, mas o nosso Rogério.
Umas semanas depois, tive a oportunidade de jantar com ele e verifiquei que tinha voltado às águas do Cristianismo, embora pela via reformista: jurava agora pelo Calvinismo, que considerava o "cristianismo mais puro e rigoroso", e até tinha descoberto perto de casa uma igreja calvinista.
No entanto, nem este ramo do protestantismo resistiu ao apelo de O SEGREDO, um livro de auto-ajuda que foi um campeão de vendas a nível mundial e até fez o nosso Rogério abrir os cordões à bolsa: comprou o dvd e até foi a alguns seminários.
Tudo era possível com este "livro maravilhoso" dizia-nos ele, sendo certo que por essa altura já fazíamos apostas entre nós sobre quanto tempo demoraria até o vermos no Chiado com a característica túnica laranja dos Hare Krishna.
Felizmente, nada de tão radical aconteceu, se bem que tememos bastante pelo nosso Rogério quando à leitura do "livro maravilhoso" se seguiu a descoberta de outro livro, "Dianética", o livro sagrado da Cientologia, escrito pelo fundador desta e antigo escritor de ficção científica L.Ron Hubbard. Aí então, valeu-lhe a sua conhecida forretice: quando soube quanto lhe custaria atingir o nível de "Clear", coisa para uns largos milhares de euros, decidiu que também a Cientologia não era a resposta que procurava. Como dizia a Maria Clara, o Rogério é do ramo da "espiritualidade sim, mas cuidado com a carteira".
Já este ano, em Março se bem me lembro, disse-me a Lúcia que tinha a certeza de tê-lo visto numa sexta-feira a entrar na Mesquita de Lisboa.
Uns dias depois, telefonei-lhe e ele confirmou o relato de Lúcia, perguntando-me logo de seguida se eu já tinha lido o Corão. Confesso que fiquei tão perplexo que nem dei muita atenção ao resto da conversa, embora tenha uma vaga ideia de ter ouvido as palavras "o imã escondido" e " milhares de virgens".
Passado o Verão, em que ninguém viu ou falou com o Rogério, tanto em Lisboa como no nosso habitual poiso no Algarve, telefonei-lhe sem sucesso: o número de telemóvel já não estava atribuído, o número fixo idem e no emprego ninguém sabia dele, tendo a secretária dito qualquer coisa sobre um processo disciplinar por faltas injustificadas.
Preocupado, fui a casa da D.Rita, a simpática e jovial mãe do Rogério. A senhora, no entanto, parecia ter envelhecido dez anos. Mostrou-me um postal, escrito na letra do filho sem sombra de dúvida, mas assinado "Ibrahim" e expedido de Kabul.
Desde então, andamos todos a tentar saber do nosso Rogério: junto do MNE, do xeique Munir da Mesquita de Lisboa que nos disse que ele " ultimamente se dava com uns elementos algo radicais " , escrevemos ao António Guterres para o caso do nosso amigo ter ido parar a algum campo de refugiados e, em desespero de causa, até fomos falar com o Nuno Rogeiro que conhece toda a gente entre Seca e Meca e está sempre muito bem informado. Infelizmente, nem o Nuno Rogeiro nos conseguiu ajudar, embora tenha sugerido que não perdíamos nada em falar com o Marcelo, que " conhece menos gente do que eu mas tem acesso ao Cavaco ".
Nada conseguimos apurar até agora, e começamos a estar cansados: pela minha parte farto de visionar tantos sites islâmicos radicais na net na esperança de ver uma fotografia do nosso Rogério-Ibrahim,e começando a recear que o SIS se interesse por mim ;e a Lúcia farta de chá: chá com a Ana Gomes, chá com a Margarida Sousa Uva, chá com a Laurinda Alves e para a semana uma audiência com a Dra.Maria Cavaco Silva, presumindo-se que com chá também.
A D.Rita está a planear ir até Kabul em Janeiro se nada se souber entretanto, e tem-nos perguntado, a mim, à Lúcia, ao Augusto Filipe e à Maria Clara, se algum de nós pode tirar uns dias de férias nessa altura para a acompanhar na viagem.
Talvez seja escusado dizer que ainda ninguém se ofereceu.

12 comentários:

João Mattos e Silva disse...

Simplesmente genial!ahahahah!!!

Anónimo disse...

Faz-me lembrar alguém que conheço, e que espero não passe hoje pelo Prosimetron...

Anónimo disse...

Será sobre quem eu penso? Fantástico!
E O Luís está na boa linha do folhetim: crónicas, o «Paraíso» (que ainda não sabemos no que vai dar)... E que mais virá?
M.

Anónimo disse...

Será que ele já leu o último Dan Brown?
M.

Anónimo disse...

Ele = Rogério.
M.

Miss Tolstoi disse...

Embora esteja de fora, gostei.

Anónimo disse...

Faço minhas as palavras de João Mattos e Silva.
Ana

Anónimo disse...

Também estou fora do contexto mas gostei do texto.
Ana

Filipe Vieira Nicolau disse...

Delicioso, genial! O post é simplesmente lindo, lindo, lindo ...

João Soares disse...

Sensacional. Nem queria acreditar no que estava a ler.

Jad disse...

Meu Deus! ou melhor: Alá, é grande! Conheço o nosso Rogério e sei o quanto ele, numa fase, esperava pela "vinda de Jesus á terra" para se lhe entregar. Acompanhei algumas das andanças do Rogério que nunca está(va) satisfeito com nada.
Será que deixou de ter o cabelo daquela cor e por isso já não o reconhecemos?

LUIS BARATA disse...

Bem, parece que por algumas reacções que antecedem alguém vê no "Rogério" um ser de carne e osso. Assim, peço-vos que imaginem no fim do texto o habitual caveat: "Qualquer semelhança com... é pura coincidência". Não quero confusões,especialmente com o Rogério amigo do nosso Jad que não é certamente o meu "Rogério" ficcionado.