Prosimetron

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quinta-feira, 30 de maio de 2013

A propósito de um livro de Etgar Keret

Trad. de Lúcia Liba Mucznik,
Porto: Ambar, 2004

«Eis a história de um motorista de autocarro que recusava abrir a porta do autocarro às pessoas atrasadas. Não abria a porta a ninguém. Nem aos alunos apressados que corriam ao longo do carro com olhares tristes, muito menos aos tipos nervosos de anoraques que davam murros na porta como se tivessem chegado a tempo e ele é que estivesse em falta, e nem sequer às velhinhas com sacos de papel craft carregados de provisões, que lhe faziam sinal com a mão a tremer. Não era por maldade que ele não abria a porta, porque não havia nele sombra de maldade, mas por ideologia. De acordo com esta ideologia, mesmo que a demora causada pela espera de um passageiro atrasado mal chegasse a meio minuto, e o passageiro que ficava em terra perdesse por isso um quarto de hora da sua vida, continuava a ser mais justo para com a sociedade não lhe abrir a porta, porque esse meio minuto era perdido por cada um dos passageiros do autocarro. E, se houvesse no autocarro sessenta pessoas que tinham chegado à paragem a tempo, perdiam em conjunto meia hora, que é o dobro de um quarto. Era esse o motivo pelo qual ele nunca abria a porta. Estava consciente de que os passageiros não faziam a menor ideia deste motivo, nem mesmo as que corriam  atrás dele a fazer sinais para ele abrir. Sabia igualmente que a maioria pensava que ele era tarado, e que seria muito mais fácil ele deixá-los subir e receber em troca agradecimentos e sorrisos. Mas, entre s agradecimentos e os sorrisos e o bem da sociedade, ele não hesitava um minuto em escolher o bem da sociedade.»
Primeiro parágrafo da pequena história, que dá título a este livro de Etgar Keret. Livro que é composto por 48 histórias-clip, que nos «mergulham num universo literário inédito».
Acho que é o único livro deste escritor israelita, nascido em Tel-Aviv em 1967, traduzido em Portugal. Há anos que espero que traduzam mais livros dele, por exemplo Missing Kissinger, que o jornal diário de maior circulação, em Israel, elegeu como o quinto livro israelita mais importante de todos os tempos. Acho que tenho de o comprar em francês.

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