Estou contentíssima por François Ozon ter adaptado O Estrangeiro ao cinema, mais de 80 anos depois do livro ter sido publicado. Aguardo que o filme estreie em Lisboa.
Le Nouvel Obs traz uma conversa entre o realizador do filme e Kamel Daoud, autor de Meursault, contre-enquête, uma releitura de O estrangeiro. Estou com muita vontade de ler este livro. A Bertrand, editora deste escritor argelino, poderia traduzi-lo.
François Ozon - «[...] tive de fazer um trabalho de pesquisa histórica, porque conhecemos muito mal este período da colonização nos anos 1930. Vi muitos arquivos, com os comentários colonialistas que elogiam «o sorriso d'Argel», o seu lado maravilhoso.... Fiz questão de integrar esse aspeto para que o espectador compreenda que era a visão dos franceses da Argélia francesa, o que isso representava para eles. Eu próprio tenho avós que aí viveram, que adoraram a Argélia e falavam como de um paraíso perdido, aliás como muitos pieds-noirs. O meu avô era juiz, escapou a um atentado e foi obrigado a voltar para França; era uma ferida no seio da família de que se não falava... Tentei descobrir o que tinham vivido lá. Eu queria mostrar, concretamente, como duas comunidades viviam lado a lado mas sem se misturarem.»
Kamel Daoud - «De facto, o apagamento desta época é duplo. Há esta imagem de paraíso perdido, colada á realidade, que elimina toda a complexidade da vida e a sua dureza para nós. Mas por outro lado, na Argélia, a literatura anterior ao eclodir da guerra foi apagada. Os escritores 'nascidos' com a guerra estão no panteão, mas os que,antes, descreviam a complexidade humana não são visíveis. São os meus pais e os meus avós que me contaram como era a vida então. Mas continua a ser tabu dizer coisas como: "Na época, era muito bonito aqui, havia flores, o prédio estava limpo, o relógio tinha ponteiros que funcionavam..."». (p. 17)
Segundo Saoud, depois da independência «Camus foi apagado. Uma espécie de auto da fé extraordinário.» E o filme não vai ser visualizado nos cinemas argelinos. Aliás, o filme foi feito em Tãnger.
No ano passado, quando fui à Argélia, apenas dez dias, fiquei espantada com a aversão que os argelinos têm aos franceses. Quando lhes perguntávamos porquê, muitos respondiam: «Não há uma família argelina que não tenha um pai, um tio ou um avô que não tenha sido torturado pelos franceses.» E os mais jovens preferiam falar inglês connosco do que francês...

11 comentários:
Também fiquei curiosa, embora saiba de antemão que nunca verei esse filme.
Bonne journée!🍂🍁
Um dos meus livros preferidos. E dos autores.
É um livro que li três ou quatro vezes em varias linguas. Sempre gosto.
Bom dia!
Um abraço
Também gostei desse livro que li há tanto ano. Gosto do realizador e pode ser que veja o filme. Camus é escritor de permanência, fica na memória de quem o lê.
Bom domingo
Provavelmente voltarei a ler o livro depois de ver o filme. Ou quando o filme estrear, Veremos...
Bom domingo para as três.
Livro meu de sempre, de Camus, não deixo de privilegiar "A Queda".
Bom Domingo!
Ler O Estrangeiro não vai ser difícil. Moram cá em casa 3 edições: Folio, Livros do Brasil e uma belíssima novela gráfica da Arcádia, que até já passou por aqui.
O livro novo que refere é que já é mais difícil...
Boas leituras!📚
Eu só tenho a da Livros do Brasil, numa col. que a editora tinha com títulos de Camus. Um dia destes mostro os meus Camus.
O livro já vendeu 11 milhões de exemplares só em França, 8,5 dos quais em ed. da Folio. Em 2024 a ed. teve 172 000 exemplares e este ano já editou mais 70 000. É o campeão de vendas desta coleção.
Boa tarde para os dois.
Como muito bem enfatizou MR, constitui uma agradável "novidade" a adaptação cinematográfica (2025), por parte de François OZON, do excelente romance de Albert CAMUS, "L'Étranger" (1942).
Tenho na minha frente um precioso exemplar da referida Obra, uma reedição (1980) da Livraria GALLIMARD (sem dúvida, uma das mais prestigiosas editoras da capital gaulesa).
A propósito, detenho-me numa passagem, inesquecível, de um outro livro de CAMUS, "L'Homme Révolté" (1951): "Ce n'est pas la révolte en elle-même qui est noble, mais ce qu'elle exige"...
Creio ainda ser indispensável (re)valorizar esta transparente mensagem, que não podemos dissociar do "combate" do Autor de "La Peste" (1947) às múltiplas formas de servidão humana e apatia cívica.
Não é, pois, de estranhar a minha inquietação pessoal perante a ausência, em determinados meios (culturais e políticos), de preocupações subjacentes ao interesse pela exemplaridade da Vida e Obra deste jornalista, escritor ("Prémio Nobel", 1957) e cidadão do Mundo.
Boa Noite!
Boa semana!
Não resisto à "tentação" de fazer aqui uma justa referência a uma das salas de Paris (Cinema "Les 5 Caumartin") onde se encontra em exibição o novo filme de François OZON, "L'Étranger", interessante adaptação do romance homónimo de Albert CAMUS.
Lembrei-me, esta manhã, daquele espaço acolhedor (próximo da Gare Saint-Lazare), no qual tivemos, há alguns meses, o gosto de assistir, maravilhados, à projecção da curiosa película de Cédric KLAPISCH, "La Venue de l'avenir", um filme (2025) de facto inolvidável, que nos transporta ao mundo fascinante da Cultura artística francesa (importa reter, por exemplo, o episódio evocativo de Claude MONET e do seu primeiro quadro "impressionista")...
Bom Dia!
Gosto muito do cinema de Klapisch e não sabia deste seu novo filme que, esperemos, seja exibido nas nossas salas.
Bom dia!
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