Prosimetron

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quinta-feira, 17 de maio de 2012

Verdades que só se escrevem aos amigos

As cartas, assim como os livros e as fotografias com dedicatória manuscrita, são do mais precioso que existe para se conhecer a vida de uma pessoa. Em 99% dos casos nunca são escritas para serem lidas por terceiros. Fazem parte dos segredos que duas pessoas trocam. Hoje só existem as smm, que se apagam e desaparecem.
Nesta foto que Botto ofereceu, a um hoje desconhecido destinatário, encontra-se escrita uma mensagem verdadeira, mas que poucos admitem escrever sobre si.
O homem cede ao desejo como a nuvem cede ao vento.

Neste caso roubou a foto e os versos à 2.ª edição das suas Canções.


ANDAVA A LUA NOS CÉUS
António Botto


Andava a lua nos céus
Com o seu bando de estrelas
Na minha alcova
Ardiam velas
Em candelabros de bronze
Pelo chão em desalinho
Os veludos pareciam
Ondas de sangue e ondas de vinho
Ele, olhava-me cismando;

E eu,
Plácidamente, fumava,
Vendo a lua branca e nua
Que pelos céus caminhava.

Aproximou-se; e em delírio
Procurou avidamente
E avidamente beijou
A minha boca de cravo
Que a beijar se recusou.

Arrastou-me para ele,
E encostado ao meu ombro
Falou-me de um pagem loiro
Que morrera de saudade
À beira-mar, a cantar...

Olhei o céu!
Agora, a lua, fugia,
Entre nuvens que tornavam
A linda noite sombria.

Deram-se as bocas num beijo,
Um beijo nervoso e lento...
O homem cede ao desejo
Como a nuvem cede ao vento
Vinha longe a madrugada.

Por fim,
Largando esse corpo
Que adormecera cansado
E que eu beijara, loucamente,
Sem sentir,
Bebia vinho, perdidamente
Bebia vinho..., até cair.


5 comentários:

Miss Tolstoi disse...

Para mim, não encontrei ainda nenhum que neste campo bata a frase de Oscar Wilde: I can resist everything except temptation.

Miss Tolstoi disse...

nenhum = nenhuma

Miss Tolstoi disse...

Não concordo consigo no caso destes dois versos que ele aproveitou de um poema. Não foi nada criado de propósito para colocar na foto.
Neste caso foi "uma verdade" que o Botto escreveu e que foi lida por todos os seus leitores.

Jad disse...

Sem a tentação... haveria a ocasião?

Jad disse...

Para Miss Tolstoi
Quando comecei o post não era para colocar nem a foto, nem o poema de António Boto.
Era antes para colocar uma carta de António Nobre, escrita a um Alfred ... que o acompanhou em Paris.
Mas guardei a carta para outra ocasião.