Prosimetron

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terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Confissão II

A beleza que encontro neste livro levou-me a transcrever mais um trecho. Talvez assim se compreenda a perturbação que qualquer ser humano pode ter e tem quando procura um sentido para a vida, uma explicação para as constantes interrogações. Não vem a despropósito esta minha escolha como poderá parecer, ela prende-se com esta época do Advento.
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"A causa, dizia a mim próprio, não é a mesma categoria de pensamento que o espaço e o tempo. Se eu existo, para isso há uma causa e também a causa das causas. e esta causa de tudo é o que se chama Deus; então, concentrava-me nesta ideia e tentava consciencializar, com todo o meu ser, a presença desta causa. E mal tomava consciência de que existia uma força, em cujo poder me encontrava, sentia de imediato a possibilidade da vida. Mas perguntava a mim próprio: « O que é esta causa, esta força? Que tenho de pensar dela, que atitude devo ter para com aquilo a que estou a chamar Deus?» E apenas me passavam pela cabeça as respostas já conhecidas: «É o criador, a Providência.» Estas respostas não me satisfaziam, e sentia que aquilo que, como sentia, me era necessário para viver estava a desaparecer em mim. Ficava aterrorizado e começava a rezar Àquele que procurava, pedindo-Lhe ajuda. Mas quanto mais rezava, mais evidente se tornava para mim que Ele não me ouvia e que não existia alguém a que fosse possível dirigir-me. Então com o desespero do coração, porque não havia, nunca mais havia Deus, eu dizia:« Deus nosso Senhor, tende piedade, salvai-me! Nosso Senhor, ensina-me!» Mas ninguém tinha piedade de mim, e sentia que a minha vida estava a parar."
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Lev Tolstoi, Confissão, Edições Alfabeto, 2010, p.113-114, (trad. e notas Nina Guerra e Filipe Guerra).
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De cristão ortodoxo à descrença Tolstoi interroga-se constantemente. Não será este tema perturbador? Talvez não seja para uns e seja para outros.

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