Prosimetron

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sábado, 30 de junho de 2012

No centenário de Jorge Amado - 1

Mem Martins: Europa-América, 1992 

Este foi o último livro de  Jorge Amado que li. E trago-o hoje porque este ano celebra-se o centenário do seu nascimento, dedicando-lhe a Biblioteca Nacional de Portugal, a Casa Ferreira de Castro e o Museu do Neorrealismo exposições.
Um livro de histórias, de estórias, entre o riso e a tragédia. O  homem e o escritor estão aqui: os seus anos como comunista, as suas prisões, as suas viagens, as suas paixões, a família e os amigos. E a sua terra: Salvador da Bahia.


Dele transcrevo uma memória porque há por aqui umas apreciadoras de Alçada Baptista:



Lisboa, 1989 - a tia

A cada encontro no restaurante de Mimi, no Parque Mayer - sem o Restaurante Amadora, o Parque já não é o mesmo -, António Alçada Baptista apresenta-me à mais bela de ofícios diferentes: a mais bela advogada de Portugal, a mais bela redatora, a mais bela dançarina e por aí vai, são muitas. A mais bela? Maneira de louvar do sedutor: bonitas todas, umas mais, outras menos, charmosas, elegantes, sobretudo apaixonadas. António as pastoreia, ar de frade em férias, pecaminoso.
«Ensaísta consagrado, polémico, António estreou na ficção com romance que fez época, entusiasmo da crítica, prémios, best-seller, O nó e os laços: o começo do livro é um achado. [...]
«Outro romancinho, Tia Suzana, meu amor [...], descreve as intimidades de pensamento, religião e cama do narrador, um rapazola - o autor fazendo-se de personagem? Só o próprio António poderia responder - e uma sua tia, balzaquiana. Na cama coçam-se mutuamente as costas, catam-se cafunés, trocam beijinhos [...] e nada mais acontece, acredite quem quiser. Dela decerto, dessa tia meio freira meio iaba, herdou António o ar de frade em férias, prevaricador.
«- Tu queres me convencer, António, que jamais tu e tua tia chegaram às vias de facto?
«- Primeiro não somos eu e minha tia, são o personagem e a Suzana, tia dele. Mas, ainda que fôssemos eu e a tia, posso te garantir que tudo não passou de ternura, nada além das cosquinhas.
«- As cosquinhas, os cafunés, os toques, os beijinhos, o fornicoques, tudo platónico?
«- Tudo. Mais pura e inocente que tia Suzana nunca houve.
«António Alçada Baptista fala sério, o ar de frade imaculado. Acredite quem quiser, eu hein! não sou daqui, não conheço os costumes locais, os hábitos de cama, na Bahia tia Suzana não escapava.» (p. 41-42)

7 comentários:

APS disse...

Vou ser polémico, MR.
Os meus 4 "magníficos" brasileiros são : Drummond e Cecília, Graciliano e Guimarães Rosa. Para não ser excessivo, acrescentaria, em segunda linha: Machado de Assis e Manuel Bandeira. Nem o Neto se salva, demasiado seco e empertigado "pour épater le bourgeois"... e a Clarice é como os "fumos da India" - só prosápia, cenário e falso
mistério: uma Agustina de 3ª
classe...
Tenho grandes dúvidas que, dentro de 30/40 anos, ainda se fale de Jorge Amado. O José Carlos de Vasconcelos já não estará vivo, nem eu (para ver) e o JL, se calhar, já não se publica.
Mas era uma pessoa simpática, bona cheirão, com gosto de viver e até em anos de tenra juventude pertencia ao PC brasileiro de Prestes. São coisas que devem ser consideradas, a benefício de inventário...

ana disse...

APS,
Permita-me discordar.
Amado tem livros intemporais como:
Capitães da Areia, Gabriela, Cravo e Canela, A morte e a morte de Quincas Berro d'Água,O gato Malhado e a andorinha Sinhá, Dona Flor e seus dois Maridos, entre outros.
Boa tarde!

MR disse...

APS,
Pode ser polémico à vontade. :)
Por alguma razão, hoje lê-se pouco Jorge Amado, por cá. No Brasil, não sei.
Fui uma grande eleitora (na minha adolescência) de Jorge Amado e de Érico Veríssimo. Li tudo do cacau e do café, mas os meus livros preferidos (para ir respondendo à Ana) são O O Cavaleiro da Esperança e ABC de Castro Alves. Depois de Dona Flor e seus dois maridos só li este Navegação de cabotagem e O gato Malhado a andorinha Sinhá (um livro para crianças). Comecei Teresa Batista cansada da guerra, mas chateava-me aquela linguagem desbragada sem sentido.
E quanto a aos meus brasileiros, todos descobertos depois de Jorge Amado e todos poetas: Drummond, Cecília e Bandeira. E depois Machado de Assis.
Quanto a Clarice... também não aprecio.
Há pouco reli Érico Veríssimo e gostei. Não tenho a certeza que o mesmo aconteça com seu Amado.
Trouxe-o porque os livros dele foram importante na minha formação.

APS disse...

Acredito que o meu "Amado" não é fácil, mas compensa...
E, numa sociedade livre (até quando?) como é a nossa, todas as opções são aceitáveis. Também eu gostei de Namora, em anos tenros, de Loureiro Botas, Marmelo e Silva, Urbano... (quem os lerá, hoje). O critério vai subindo de exigência, com a idade. E é bom termos em conta, sempre, a efemeridade do presente, para deixar passar o Rodrigues dos Santos, O Paulo Coelho, a Corín Tellado. Quantos portugueses saberão de Aníbal Soares que foi "best-seller", com o seu "Ambrósio das Mercês", no dealbar do séc. XX? "Sic transit..."
Uma boa tarde!

MR disse...

APS,
Não estava a falar do Guimarães Rosa, estava a falar do Jorge Amado, que muitas vezes é tratado por «Seu Amado». :)
Bom dia!

MR disse...

Até acho que o Guimarães Rosa é dos que vai perdurar. :)

Ricardo António Alves disse...

É claro que o Jorge Amado vai ficar. Ele é um escritor da estirpe de um Balzac, de um Dickens, de um Eça. Eu acrescentaria a alguns livros referidos pela Ana: «Jubiabá», «Mar Morto», «Terras do Sem-Fim» ou «Tenda dos Milagres».