Prosimetron

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quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

A minha vinheta

Sobre a horrorosa carnificina do jornal satírico Charlie Hebdo, acto terrorista inadmissível que infelizmente hoje se continuou com a morte a tiro de metralhadora de dois polícias em Paris, escrevi no Face Book o texto que transcrevo. Porque certamente não é com sensual, optei pelo título deste post como "a minha vinheta" e não, como é habitual, "a nossa".
 
 
 
 
"O ataque terrorista ao jornal satírico Charlie Hebdo suscita-me quatro comentários:
- É abominável este ataque que causou doze mortos (e se fosse apenas um, continuava a ser abominável) e a França não pode deixar de aplicar a pena máxima aos terroristas que o executaram e aos seus mandantes, se conseguirem saber quem são. E o Ocidente não pode encolher-se de medo nem hesitar em reagir com determin...ação, força e, se for preciso, dureza.
- O que está em causa é a nossa liberdade colectiva e individual e a continuidade do Ocidente como o conhecemos, mesmo com incongruências e erros que temos de ser nós a resolver.
- Estes actos de terrorismo islâmico deveriam fazer pensar os que se escandalizam tanto com franceses e alemães, por exemplo, por aquilo a que chamam xenofobia quando se manifestam, porque veem os seus países invadidos por pessoas que ali foram procurar o sustento que não obtiveram nos seus países de origem e se recusam a integrar-se nas suas sociedades e não respeitam os seus valores e culturas. Como as autoridades desses países, particularmente de França, se têm deixado manipular, em nome de uma tolerância que não é sequer reconhecida, as populações começam a revoltar-se e a manifestar essa revolta, preferindo os partidos extremistas que lhes permitiriam uma outra visão sobre a emigração islâmica que, de facto, em França é assustadora e faz perigar as liberdades ocidentais.
-Dito isto e condenando sem hesitar este acto miserável, não posso deixar de dizer que a liberdade e nomeadamente a liberdade de imprensa, deve ter limites e que não é tolerável, desigandamennte, que se ofendam as crenças religiosas, seja qual a for a religião, que para os que as possuem são um valor absoluto. Nos países ocidentais, se um jornal satírico de um país do Islão satirizasse Jesus, só se ouviria a condenação das igrejas e poucos mais. Nesta “cultura” laica em que mergulhámos nenhum governo se indignaria e dada a nossa cultura tolerante, ninguém perpetraria um acto terrorista em retaliação. Mas para os muçulmanos, que são, por natureza da leitura intolerante geralmente feita do Alcorão, intolerantes, a questão é séria e não admitem que uns fazedores de cartoons ridicularizem os valores da sua religião que está acima de tudo. Talvez os defensores da liberdade de imprensa como valor absoluto, devessem pensar nisto."


8 comentários:

ana disse...

João,
Apreciei o seu texto e concordo em parte. Isto é:
a) Fiquei consternada com a situação. Também quando fiz o meu registo não coloquei "Je suis Charlie" porque não sabia se era consensual.
b) Julgo que o sentido de humor faz parte da inteligência e temos que nos saber rir de nós próprios.
c) No entanto, julgo que tem razão: há sátiras e sátiras. O bom senso devia imperar.
d) A censura na escrita/imagem já me arrepia.
Bom dia!:))

João Mattos e Silva disse...

Ana, afinal acaba por concordar quando diz que há sátiras e sátiras. Rir de nós próprios, como diz, é integrante da inteligência, mas não é disso que se trata: é fazer graça de valores que para os outros - ou até para nós própios - são sagrados. E não se trata de censura, mas de saber quais os limites da nossa liberdade: quando viola a dos outros.

MR disse...

JMS,
Concordo com a escolha da vinheta, mas não concordo inteiramente com o texto.
Em relação ao 4.º parágrafo, os franceses são dos que mais lutam pela laicização do Estado. Veja-se o que aconteceu quando Sarkozy propôs e o parlamento francês aprovou a proibição do uso do véu nas escola pública francesa.
Em relação ao último parágrafo, não concordo com o que defende. E veja-se o que o representante da igreja muçulmana ontem afirmou em Paris: terroristas são terroristas.
Acho é que a Europa não tem conseguido integrar os seus imigrantes, que muitas vezes vivem em guetos. Isto é que é preocupante e temos de resolver este problema.

João Mattos e Silva disse...

MR, sabia de antemão que não iria concordar e por isso não me espanta que ache que laicização do Estado - com o que concordo absolutamente - é o mesmo que desrespeito ou gozo com as crenças das populações que integram esse Estado. E não me parece que seja a falha na integração dos emigrantes que crie situações destas. Outros emigrantes, de outras origens, não cometem actos extremos de terrorismo como os muçulmanos.
Mas, felizmente, somos livres para opinar de formas diferentes.

Filipe Vieira Nicolau disse...

Caro João, compreendo a sua opinião que expressa no último parágrafo e, infelizmente, acabo por concordar. Infelizmente, na medida em que gostaríamos todos de preservar a liberdade de imprensa como valor intocável, integrada num conjunto de princípios de que a civilização ocidental pensa poder orgulhar-se. No entanto, há limites. Vi hoje alguns cartoons do Charlie Hebdo, publicados na edição do DN, e pergunto: é necessário irmos tão longe? Já nem questiono a linguagem, mas sim o bom senso destes textos. Há sátiras e sátiras, e estas entram numa zona muito cinzenta em que os muçulmanos (e não me refiro aos radicais, já que esses aproveitam tudo para seguir os seus fins) podem sentir-se, legitimamente, ofendidos. E aí, como o João afirma e bem, termina a liberdade.
Que fique claro: nada justifica a "horrorosa carnificina" de ontem. Os terroristas radicais devem ser punidos com todos os meios, conforme indicado no primeiro parágrafo. E devemos defender o que se nos afigura importante - de louvar por isso a iniciativa hoje em Lisboa de que o post de M.R. nos informa.
Mas devemos igualmente repensar os perigos e os limites de determinadas atitudes do Ocidente.

MR disse...

Quando falei de laicização tinha a ver com a não permissão dos véus nas escolas públicas.
Quanto à não integração dos imigrantes, acho que tem muito a ver com as condições de vida que eles têm. Todos sabemos que a pobreza é um bom campo para a radicalização. E daí ao fanatismo...
Os assassinos de ontem são franceses, nascidos em França.

Anónimo disse...

João Mattos e Silva,
O que se passa é que esta geração já não é de imigrantes, é uma geração de franceses e quando olham para o lado, para os franceses, seus concidadãos, acham que não vivem do mesmo modo, nem tiveram as mesmas oportunidades. Esta é que me parece ser a questão mais pertinente e que esteve na origem dos motins no tempo de Sarkozy, o qual teve aquela tirada, bastante infeliz, de lhes chamar escumalha.
Eu sei que Sarkozy também é filho de imigrantes, mas europeus, o que, queiramos ou não, faz toda a diferença. Infelizmente!
Obviamente que estes tipos são assassinos, mas o Ocidente é que os está a formar.
Miss Tolstoi

João Mattos e Silva disse...

MR e Miss Tolstoi. É verdade que as políticas de integração dos emigrantes é uma nódoa em França, tanto como em Portugal. Mas insisto em considerar que neste caso é uma questão religiosa e cultural e não de má integração da emigração. Veja a comunidade portuguesa que viveu em barracas (hoje não é assim) e não fez motins, ou outras que vivem no país e são pacíficas. Estes irmãos são extremistas que se manifestaram pelo terror. Falaram em pobreza? Não, falaram de Maomé que dizem ter vingado. Mas o mal estar existe na comunidade muçulmana e não é só pela pobreza e desigualdade de oportunidades.