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terça-feira, 17 de agosto de 2010

Bruce Chatwin: O grande viajante


Na história do jornalismo há um despedimento que ficou famoso. Corria o ano de 1977 quando Bruce Chatwin decide abandonar a redacção do The Sunday Times Magazine, onde colaborava sobretudo com artigos de viagens para concretizar um sonho: viajar até ao fim do mundo. Para isso envia um telegrama para o jornal dizendo apenas: Fui para a Patagónia. Com um percurso académico e profissional algo instável, Chatwin abandona a escola aos 18 anos para começar a trabalhar na Sotheby's onde tem uma rápida ascensão graças ao seu talento para descobrir obras de arte falsificadas. Mais tarde e queixando-se de problemas de visão devido ao seu trabalho minucioso, abandona aquela leiloeira decidido a estudar Arqueologia, mas também desiste para se dedicar por inteiro à escrita e à investigação de uma temática que o fascinava: o nomadismo. Da sua estadia na Patagónia surge a obra "Na Patagónia" que lhe trouxe fama mundial como escritor e viajante, na medida em Chatwin recupera o conceito de livro de viagens voltando a dar corpo ao mito do viajante imparável e solitário, mas num misto de realidade e ficção. Isso conduziu-o a algum descrédito por parte de alguns visados nas suas obras que não se reconhecem naquilo que ele escreveu, muito menos consideram positivas as distorções que fez da realidade social e cultural dos lugares que visitou, nomeadamente na Austrália onde durante meses pesquisou sobre as canções dos aborígenes. Mas o mais interessante é que Chatwin fez o mesmo com a sua história pessoal, confundindo biógrafos com datas de nascimento erradas, criando diferentes passados familiares ou académicos. Consciente de que a sua ambiguidade sexual e a intriga de almofada alimentam o mito, deixou ordem expressa para que após a sua morte os seus cadernos de anotações só fossem abertos em 2010. Muito se especulou sobre o conteúdos desses cadernos, adivinhando-se revelãções explosivas, mas o que se encontrou foram apenas citações de outros escritores e apontamentos literários. Antes de morrer em 1989, aos 49 anos, afirmou que tinha contraído uma doença de ossos incurável durante uma viagem à China, um final trágico digno de um autêntico viajante que serviu para ocultar a origem da sua doença, o vírus HIV tinha-se debilitado o sistema imunitário. The Viceroy of Ouidah (1980), On The Black Hill (1982), The Songlines (1987), Utz (1988) e What I'm Doing Here? (1989) são os outros livros que fazem parte da sua obra.
Nota: Este post resultou de uma conversa tida há dias com o nosso LB, justamente sobre despedimentos, em que ele referiu este exemplo. Obviamente que quis conhecer o autor de tão original atitude. Aqui está.

1 comentário:

LUIS BARATA disse...

É sem dúvida uma das mais extraordinárias rescisões unilaterais que conheço...
Um escritor-viajante que foi ele próprio uma personagem. E quando fui à Patagónia, lá vi vários membros do grupo a lerem o agora clássico de Chatwin.