Prosimetron

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segunda-feira, 13 de outubro de 2014

Citações



(...) Vejam-se as constantes campanhas filantrópicas a favor da leitura e dos livros, como se estes fossem impermeáveis a odiosas astúcias ( ou, pelo menos, espertezas saloias, como acontece com a edição póstuma do romance inacabado de José Saramago ). Ora, esta fala ruidosa em torno dos livros tornou-se tão poderosa que faz calar toda a crítica. O problema, hoje, não é uma censura que impeça as pessoas de falar, mas a lógica que obriga a falar e institui o ruído. Não é o silêncio que é uma ameaça, mas o ser forçado a falar, sem escolha, sem silêncio. Nada é interdito, mas há aquilo que é difundido para além do visível e do audível. Transpondo isto para a situação da indústria do livro, podemos dizer que são hoje bem visíveis os efeitos nefastos, devastadores, da concentração editorial e, muito especialmente, do controlo que os grandes grupos editoriais detêm sobre todo o circuito de produção, comercialização e difusão dos livros. Não há sector tão " desregulado " como este. E, para corrigir este estado de coisas, nem sequer era necessário instituir, por exemplo, uma autoridade com o poder de decretar que a maneira como foi editado o romance inacabado de José Saramago é inaceitável, na medida em que oculta ao leitor algumas informações que seriam necessárias para ele decidir se deve ou não comprar o livro e que protocolos de leitura é que lhe são exigidos.

- António Guerreiro, no Público de Sexta-feira, 10 de Outubro.

1 comentário:

MR disse...

A falta de crítica em Portugal não é de hoje.
Que acho que é um setor desregulado, acho. Principalmente para os autores se se encontram no domínio público. Para isso é que essa coisa chamada Instituto do Livro devia servir, mas regular as edições de autores como Pessoa, Camões e outros.
Quanto ao romance de Saramago, não conheço. Mas, em princípio, sou a favor de não se editarem obras inacabadas e reeditarem obras editadas, mas que foram rejeitadas pelos autores (tb neste caso essa entidade devia intervir).