Prosimetron

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quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Soneto de Eurydice

Este poema veio-me hoje parar às mãos, ao folhear uma antologia.


Rubens - Orfeu e Eurídice, 1636-1638
[Hades e Proserpina estão sentados no trono, à direita]
Madrid, Museo del Prado

Eurydice perdida que no cheiro
E nas vozes do mar procura Orpheu:
Ausência que povoa terra e céu
E cobre de silêncio o mundo inteiro.

Assim bebi manhãs de nevoeiro
E deixei de estar viva e de ser eu
Em procura de um rosto que era o meu
O meu rosto secreto e verdadeiro.

Porém nem nas marés, nem na miragem
Eu te encontrei. Erguia-se somente
O rosto liso e puro da paisagem.

E devagar tornei-me transparente
Como morte nascida à tua imagem
E no mundo perdida esterilmente.

Sophia de Mello Breyner Andresen
In: Cem sonetos portugueses / sel. [...] José Fanha, José Jorge Letria. Lisboa: Terramar, 2002, p. 109

1 comentário:

Anónimo disse...

Gosto muito da Sophia de Mello Breyner e deste poema dela.
O quadro pude vê-lo no Prado e é magnífico.

Eurydice foi feliz porque se esfumou e está espalhada pelo mar inteiro...
Nada melhor do que ser a rainha do mar e do ar.
A.R.