Prosimetron

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sábado, 6 de fevereiro de 2010

A.S.: Escolhas Pessoais XVI

Antonio Machado


Retrato de Machado por Alvaro Delgado

Antonio Cipriano José Maria y Francisco de Santa Ana Machado y Ruiz (1875-1939), como poeta conhecido, simplesmente, por Antonio Machado, é uma das figuras mais importantes do grupo denominado “Geração de 98” em que também pontificaram seu irmão Manuel Machado (1874-1947) e o prémio Nobel Juan Ramón Jimenez (1881-1958). Nascido em Sevilha (“A minha infância são lembranças dum pátio de Sevilha / e de um horto claro onde brilha um limoeiro; / a juventude vinte anos em terras de Castela; / a minha história, alguns casos que não quero recordar…"), Machado viveu também em Paris, onde conheceu Verlaine, vindo a fixar-se por Madrid; até que, quando do avanço das tropas de Franco sobre a capital espanhola, é evacuado para Valência, depois Barcelona, refugiando-se, de seguida, em França onde veio a morrer pouco depois, a 22 de Fevereiro de 1939, três dias antes de sua Mãe que o acompanhara.
A sua poesia, bem como a de dois heterónimos que criou (Abel Martín e Juan de Mairena), passa rapidamente da fase inicial, mais rebuscada, para um período amadurecido de grande simplicidade em que o verso alexandrino produz aquele efeito mais sereno e pausado (“Amo a beleza, e na moderna estética, / cortei as velhas rosas do jardim de Ronsard; / mas não quero os adornos da actual cosmética, / nem sou um desses pássaros de alegre cantar…”) e alterna com pequenos tercetos que se aproximam muito dos “hai-ku” japoneses:

“Prestai atenção:
um coração solitário
não é um coração.”

Na forma que não no conteúdo, mais de reflexão que de motivo panteísta.
A geografia e paisagem castelhana, com o Douro predominante, são temas recorrentes de Antonio Machado em “Campos de Castela”, a sua obra mais conhecida, bem como os aforismos de sabor quase filosófico (“…Caminhante, não há caminho, / o caminho faz-se a andar…”) ou um diálogo interrogativo de certa religiosidade.


Quadro de G. Chirico

Um simbolismo muito próprio atravessa também alguns dos seus poemas em que as parábolas têm um halo de mistério metafísico, com uma linearidade quase abstracta, mas sempre muito sugestiva ao nível das imagens que projecta no seu leitor:

“A praça tem uma torre,
a torre tem um balcão,
o balcão tem uma dama,
a dama uma branca flor.
Passou lá um cavaleiro
- quem sabe porque passou! -
e levou consigo a praça,
com sua torre e balcão,
com o balcão e a dama,
a dama e a branca flor.”

P.S.: Proponho algumas referências de leitura, pessoalmente, para este último poema. Com tudo o que isso implica de, eventualmente, redutor ou excessivo.
A torre que surge no primeiro verso poderia ser uma reminiscência, em forma abstracta, da “Giralda” de Sevilha, cidade natal do Poeta. A dama com a branca flor a noiva-mulher, Leonor Izquierdo, com quem A.M., então com trinta e quatro anos, se casou, em 1909, tendo ela apenas 15 anos. E que veio a falecer em 1912, de tuberculose, deixando Antonio Machado em funda depressão. Finalmente, o cavaleiro seria a figura da Morte. Que tudo levou, deixando apenas o vazio.

Post de Alberto Soares

6 comentários:

ana disse...

Belísimo post. Gostei do poema "A praça tem uma torre" allusiva ao quadro de Chirico de quem gosto bastante.
Há uns tempos andei a ler alguns poetas da "geração de 98".

Ontem, curiosamente, não conseguia dormir e naveguei na net à procura de poesia, encontrei um de Ruan Jimenez. Se calhar vou colocá-lo.

Gosto de haikai ou no plural haiku, julgo que é assim. Tenho um amigo que andou nessa onda mas fazia mais haiku em inglês do que em português.

ana disse...

Uma flor esquecida/
na mesa redonda/era branca
a sua cor.

:)é uma tentativa...

MR disse...

Belíssimo texto sobre um poeta da minha preferência.
Estive a passar a vista por uma antologia de prosa de Antonio Machado e vou colocar umas reflexões dele, se assim lhes posso chamar.

LUIS BARATA disse...

Desconhecia alguns dos pormenores biográficos aqui apresentados. Mais uma excelente escolha.

MR disse...

A los tradicionalistas convendría recordales lo que tantas veces se há dicho contra ellos:
Primero. Que si la historia es, como el tiempo, irreversible, no hay manera de restaurar lo pasado.
Segundo. Que si hay algo en la historia fuera del tiempo, valores eternos, eso que no ha pasado, tampoco puede restaurarse.
Tercero. Que si aquellos polvos trajeron estos lodos, no se puede condenar el presente y absolver el pasado.
Cuarto. Que si tornásemos a aquellos polvos volveríamos a estos lodos.
Quinto. Que todo reaccionarismo consecuente termina en la caverna o en una edad de oro, en la cual sólo, y a medias, creía Juan Jacobo Rousseau.

Antonio Machado
In: A la altura de las circunstancias. Madrid: Cuadernos para El Dialogo, 1972, p. 61

APS disse...

Para MR:
Não conhecia estas consideraçôes de A.M..Acho-as muito interessantes.
Gracías!