Prosimetron

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quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Leituras no Metro - 138


Em 1891 uma vaga de fome atravessou a Rússia, o que levou à perda de milhares de vidas. Foram os relatos que autores como Tolstoi, Tchekov e Korolenko fizeram publicar nos jornais que alertaram o povo e o governo para a imensidade do problema.
Tolstoi e os seus filhos mais velhos envolveram-se na constituição de cantinas para alimentar os carenciados. A mulher do escritor, Sofia, que tivera de ficar em Moscovo com os filhos mais novos, resolve escrever um apelo pedindo donativos. Eis o texto publicado no Russian Gazette, em 3 de novembro desse ano:
«A minha família inteira deixou-me para ir ajudar os necessitados. O meu marido, o conde Lev Nikolaevich Tolstoi, e as nossas duas filhas estão no distrito de Dankovsky a instalar cantinas [...]. Tenho dois filhos mais velhos a trabalhar para a Cruz Vermelha, ajudando as pessoas do distrito de Chernsky, e um terceiro na província de Samara a abrir uma sopa dos pobres.
«Forçada a ficar em Moscovo com os nossos quatro filhos mais pequenos, só posso ajudar dando apoio material à minha família. Mas a carência é tanta! Sozinhas, as pessoas não podem satisfazer tanta necessidade. Entretanto, passamos os nossos dias numa casa aquecida, e cada pedaço de comida que tragamos parece repreender-nos por, neste momento, alguém estar a morrer à fome. Se nenhum de nós, que vivemos neste luxo, aguenta assistir ao menor sinal de sofrimento dos nossos filhos, como nos é possível suportar a visão de mães exaustas com os filhos a morrer de frio e de fome, ou de pessoas idosas sem nada para comer?
«Foi isso que viu a minha família. Eis o que me escreve a dizer a minha filha, do distrito de Dankovsky, acerca das cantinas que a nobreza local lá instalou com os seus próprios fundos: "Visitei duas cantinas: numa, disposta numa capoeira, está uma viúva a cozinhar para vinte e cinco pessoas. Quando lá entrei, deparei-me com muitas crianças ordenadamente sentadas à mesa, a comer sopa de couve [...]. Havia uma fila de idosas, à espera da sua vez. Falei com uma e, quando ela começou  a contar-me como viviam, desatou a soluçar [...]. Só estão vivos graças a essa cantina, pois em casa não têm absolutamente nada [...]. Aí comem duas vezes por dia e, com a lenha, custa cerca de [...] 1 rublo e 30 copeques por mês alimentar uma pessoa."
«Isto significa que 13 rublos salvarão uma pessoa e fá-la-ão chegar até à colheita seguinte. [...] Se cada um de nós alimentar uma pessoa, ou duas, dez ou cem pessoas - tantas quantas pudermos - , ficaremos com as consciências mais tranquilas. [...] Assim, quero pedir a todos os que estiverem dispostos a ajudar que apoiem esta iniciativa da minha família. Os vossos donativos serão diretamente utilizados para alimentar as crianças e os idosos nas cantinas que o meu marido e os meus filhos  estão a organizar.»
A família reuniu, em dois anos, 200000 rublos.
Cit. in: Alexandra Popoff - Sofia Tolstoi: uma biografia. Porto: Civilização, 2011, p. 227-228

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