Prosimetron

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segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Primeiro Fausto - a luta entre a Inteligência e a Vida


Primeiro Fausto

xO conjunto do drama representa a luta entre a Inteligência e a Vida em que a inteligência é sempre vencida. A Inteligência é representada por Fausto, e a Vida diversamente, segundo as circunstâncias acidentais do drama.
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No 1º acto, a luta consiste em a Inteligência querer compreender a Vida, sendo derrotada, e compreendendo só que não pode nunca compreender a vida. Assim, este acto é todo disquisições intelectuais e abstractas, em que o mistério do mundo (tema geral, aliás, da obra inteira, pois que é o tema central da Inteligência) é repetidamente tratado.
No 1º entreacto há a repetição lírica das conclusões a que o protagonista chegará no 1º acto.
No 2º acto a luta passa a ser a da Inteligência para dirigir a Vida, sofrendo na tentativa igual derrota, embora de outra maneira. A dificuldade está na maneira de representar essa Vida que a Inteligência tenta dominar. O preferível é representar essa Vida por discípulo ou alguém assim, em quem, por não compreender a subtileza e o género de ambição do Mestre, as pretensas vontades e imposições deste nenhuma impressão causam, ou causam uma impressão falsa. O melhor talvez é representar a Vida aqui por três discípulos ou outras pessoas — um sobre quem a acção intelectual é nula, outro por quem é aceite erroneamente, pervertidamente, e um terceiro por quem é de instinto combatida, com uso também da Inteligência, que nele é arma, meio, instrumento para o instinto se manifestar.
O 2º entreacto resume a lição que o drama do 2º acto põe humanamente. Este entreacto é lírico como o primeiro. (Estudar o género lírico, da direcção essencial deste entreacto).
O 3º Acto envolve a luta da Inteligência para se adaptar à Vida, que, neste ponto, é, como é de esperar, representada pelo Amor, isto é, por uma figura feminina, Maria, a quem Fausto tenta saber amar.
xQue fazes tu?
FAUSTO:
Tento saber amar.
Nasceu morto o que quis de mim.
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A derrota da Inteligência é igualmente flagrante neste caso. O acto fecha com o monólogo da noite, de especial amargura, porque a incapacidade de adaptação à vida é mais amarga que a falência em compreendê-la e dirigi-la, que são, a 1ª mais horrível (pelo mistério essencial) a 2ª mais desilusionante (pela disparidade entre os resultados e o esforço empregado e a sua direcção intencional).
O 3º entreacto, lírico também, é difícil de determinar que orientação tenha. (Não deve ser este sem dúvida o entreacto dionisíaco) (??)
No 4º acto a tentativa que falha é a de dissolver a Vida, em que a raiva da inimizade falha ante a capacidade de reacção da Vida, caindo no Hábito (os revoltosos que reconhecem senhor o senhor contra quem se revoltaram), no Prazer Mais Próximo, e na Indiferença entre os grandes fins, ainda que tenham um apelo para o instinto (o que é representado pela cena em que os amorosos ouvem passar ao longe indiferentemente o tumultar da revolta).
O 4º entreacto deve ser o mais frio de todos.
No 5º acto temos, finalmente, a Morte, a falência final da Inteligência ante a Vida. Enquanto se dança e se brinca em uma festa de dia-santo, Fausto agoniza ignorado. E o drama fecha com a canção do Espírito da Noite, repondo o elemento do terror do Mistério, que envolve tanto a Vida como a inteligência — canção simples e fria.
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Um dos principais estudos a fazer aqui é o da natureza dos entreactos. Sem dúvida que o 1º deve ser o de lirismo metafísico, que acaba com a canção «a catarata de sonho». O 2º entreacto, na passagem da falência da Inteligência para dirigir a sua falência para se adaptar, deve ser o mais suave de todos, embora um resaibo da falência que vai haver deva talvez pairar na lírica por ele espalhada.
O 3º entreacto é sem dúvida o dionisíaco, porque a tendência dionisíaca da Inteligência é que a leva a dissolver a Vida, tanto pelo erro no instinto, que leva ao excesso absurdo e teorizado, como pela raiva imanente nesse excesso. O 4º entreacto, que é o que é bom que comece com a canção do Destino (??), fecha friamente a série lírica, o comentário lírico que os entreactos constituem.
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É este, aproximadamente quanto aos detalhes, o ambiente dramático do Primeiro Fausto.
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Outro modo de pôr o mesmo problema, ou, antes, a mesma tese:
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1º Acto: Conflito da Inteligência consigo própria.
2º Acto: Conflito da Inteligência com as outras Inteligências.
3º Acto: Conflito da Inteligência com a Emoção.
4ºActo: Conflito da Inteligência com a Acção.
5º Acto: Derrota da Inteligência.
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s.d.
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Fernando Pessoa, Primeiro Fausto” in Poemas Dramáticos. (Nota explicativa e notas de Eduardo Freitas da Costa.) Lisboa: Ática, 1952 (imp.1966) , p. 190-192

4 comentários:

LUIS BARATA disse...

Este Eduardo F. da Costa será o pai do Miguel? Alguém sabe?

MR disse...

Não sei, mas isto talvez ajude: Eduardo Freitas da Costa (1915-1980).

MR disse...

Familiar deve ser.

LUIS BARATA disse...

Deve ser o pai.Obrigado.