Prosimetron

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quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Conta-corrente


 Interior da Livraria Bertrand da Av. de Roma.
Não me recordo se a Livraria Barata já estava neste local em 1984. Ou se ainda era a velha Barata.

«31-Agosto [1984] (sexta). E é assim quase todos os dias. As manhãs ainda vão: há que ir buscar o pão e o jornal, que são o alimento do corpo e do espírito, há que ver o correio e assim. Mas as tardes? É uma longa pasmaceira aqui sozinho em casa. E há o ca.lor que a sufoca. Lisboa regressa das praias e campo. Mas traz com o engrossamento de trânsito um sol de inferno que era bom para lá. De modo que, para cortar o fastio, fui até às livrarias, a Bertrand e a Barata. Levava uns livros fisgados para justificar a caloreira que apanhava. Mas, como quase sempre, a um breve folhear distraído, caiu-me logo no estômago uma náusea de desânimo. Que diabo de leitura me pode ainda prender? Que novidade para a minha saturação? E aqui estou de regresso neste dizê-lo sem mais. Se ao menos o romance rompesse enfim caminho. Porque o curioso é isto: eu estou saturado mas não concebo que o meu leitor esteja. [...]»
Vergílio Ferreira
In: Conta-corrente: 1984-1885. Lisboa: Bertrand, 1987, vol. 5, p. 190

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