Prosimetron

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segunda-feira, 2 de março de 2009

Os meus filmes 18

The Reader (2008) [O Leitor]
Realizador: Stephen Daldry

As sociedades pensam que funcionam por conceitos morais....

Não importa o que eu penso.
Não importa o que eu sinto.
Os mortos continuam mortos...

Será que a História pode ser julgada?



Kate Winslet - Hanna Schmitz
David Kross - Michael Berg
Ralph Fiennes- Michael Berg
Bruno Ganz - Professor Rohl
Lena Olin - Ilana Mather / Rose Mather

31 comentários:

Miss Tolstoi disse...

Acha que a História não pode ser julgada? Eu acho que sim e está sempre a sê-lo. Até para ver se certas situações não se repetem. Mas parece que não tem dado muito resultado.
Sabemos que as pessoas em multidão, por vezes, se comportam de forma estranha e irracional, que o Nazismo não era "pera doce", mas candidatar-se a um lugar de guarda dum campo de concentração... E dizer ao juiz que escolhia todos os dias um grupo de crianças para serem cremadas porque todos os dias chegavam novas mulheres e não havia espaço, perguntando-lhe: "O que é que V. fazia?" Ele ficou calado, siderado. Porque não sabia o que responder? Ou pelo insólito da pergunta?
Para mim o que é interessante no filme são os laços fortíssimos que se criam entre Hannah e Michael, pelo desconhecimento do passado dela, e o arcar com a culpa-prisão pela não assunção do seu analfabetismo, por vergonha.
Eu também adorei o filme.

LUIS BARATA disse...

A História pode e deve ser julgada, mas não só com os olhos do presente, são precisas "lentes de correcção" que adaptem a nossa visão.
Julgar a Idade Média com os conceitos e as categorias do séc.XX é absurdo.

Jad disse...

Lancei a pergunta exactamente para que haja um debate sobre o filme.

A História todos os dias é julgada com diferentes olhares, na maioria dos casos com preconceitos. O papel dificil do Historiador é contar a HISTÓRIA sem construções, com neutralidade.

A História tem de ser conhecida para se evitarem erros e repetições de passados que são considerados trágicos para a Humanidade.

Mas a História tem de ser enquadrada.

No meu ponto de vista todos temos de ser actuantes no presente (como salientou o Professor do Seminário) e não no passado!

Será que Michael não escolheu, por preconceito ou por vergonha, uma vítima ... que ficou apenas em prisão "perpétua" porque não havia pena maior? Será que não fez um crime, também, por não ter actuado quando podia e devia?

Jad disse...

O filme que está a passar em Portugal não está completo.

No Trailer "oficial" aparecem imagens que não passam por cá. Um exemplo: a procura de Hannah por Michael em 1958... o que pode ajudar a explicar a seu comportamento oito anos depois! Um abandonado (que não compreendeu por que o fora)... e que depois abandona.

Ficam tantas e tantas perguntas...
Confesso que ainda não li o livro!

Anónimo disse...

E nós temos os olhos da Idade Média? Mesmo com as lentes de correcção? É que já ouvi uma eminente historiadora limpar a Inquisição com essa a conversa de que não podíamos avaliar a Inquisição com os olhos de hoje. Mas, a verdade, é que nas épocas várias, sempre houve gente que se expressou contra. Com os olhos de então.
M.

MR disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
LUIS BARATA disse...

Conhecida e enquadrada- estamos absolutamente de acordo.
Mas há uma grande diferença entre jovens de 15,16 e 17 anos que na fase final da Guerra foram recrutados à força e apesar disso pagaram o preço, mesmo os que sobreviveram aos combates,e quem se ofereceu para ser guarda num campo de concentração.
Há sempre diversos graus de culpa...

Anónimo disse...

Jad,
Mas alguém está a pensar em oferecer-to.
M.

Jad disse...

Como diz o fabuloso Prof. Bruno Ganz (Elie Wiesel) temos de tirar uma lição do passado para actuarmos no presente!

Anónimo disse...

Ela não foi recrutada à força.
M.

Anónimo disse...

Isto está animado! Animadíssimo!
M.

LUIS BARATA disse...

Para a M:
É e será sempre uma aproximação, seja para a Idade Média ou para outro período histórico.
Evidentemente, houve sempre vozes precursoras- penso logo num Montaigne, a propósito das Guerras de Religião que assolavam a França do seu tempo, ou num Voltaire, talvez o primeiro intelectual com verdadeira influência e audiência- e são essas que admiramos precisamente por verem muito além do "air du temps".

Jad disse...

Sem dúvida que os que se comportam contra a Humanidade devem ser combatidos e julgados. A dúvida é se o podem ser passados mais de vinte anos...

"Não importa o que eu penso.
Não importa o que eu sinto.
Os mortos continuam mortos...
"

Jad disse...

Uma declaração: sou totalmente contra todos os crimes cometidos contra a Humanidade!
E sob o meu olhar Michael também comeu um crime...

Jad disse...

E até cometeu um segundo crime... pela sua frieza levou a mais uma morte. Bastava que ele tivesse, passados vinte anos (1988, outra actuação

LUIS BARATA disse...

Para mim, é claro que sim. Os crimes contra a humanidade não prescrevem.
Embora também sinta algumas dúvidas quando vejo criminosos velhos e frágeis a serem julgados como está a acontecer agora com os antigos dirigentes do Khmer Rouge, culpados de um dos mais monstruosos regimes do séc.XX, a verdade é que além de se fazer justiça às vítimas, há também um efeito pedagógico.
Deixar em paz os sequazes de Pol Pot, com o sangue de um milhão de pessoas nas mãos, porque têm 80 anos seria uma segunda morte para as vítimas.

Anónimo disse...

Jad,
Acho que os crimes devem ser julgados passados 20 anos. Penso que estes crimes nem prescrevem.
Não terá também pesado em Michael ficar calado algum sentimento de vergonha o ter-se relacionado com Hannah, quando soube que ela tinha sido guarda de campo de concentração e tudo o que ouviu no Tribunal?
Não sei se ele cometeu um crime. As relações amorosas são estranhas.

Luís,
«L'air du temps» foi imensos anos o meu perfume.
M.

Jad disse...

Tive a oportunidade de ver, em Buenos-Aires, em 2008, que ainda continuavam, durante a missa, algumas pessoas com a fotografia (em cartaz) presa ao pescoço, reclamando justiça pelos seus familiares desaparecidos durante a ditadura. Para quem sofreu realmente o crime nunca prescreve.

Jad disse...

Uma grande lição que me ficou do filme e que espero não esquecer é que temos de ser sempre actuantes no presente!

Miss Tolstoi disse...

Onde isto já vai!
Também me impressiona ver velhos a serem julgados, principalmente quando estão fragilizados, mas esses tipos do Kmer Vermelho não se coibiram de matar sem olhar a quem.

ana disse...

a) Todas as sociedades se organizam aliadas a conceitos morais... Não conheço nenhuma que não o faça. O Direito que regula a sociedade tem sempre conceitos morais/filosóficos- noção de bem e mal.
b) A História, a meu ver, é sempre julgada. É sempre mais fácil para quem está distante no tempo de julgar. Porque é que se fez isto e não aquilo? Porque é que o homem não aprende com os erros do passado? Para que é que serve a História se não é para melhorar e fazer evoluir a Humanidade?
Isto são as concepções das pessoas que olham para o passado. Por isso a História é e deve ser sempre julgada.
c) As frases de Hanna que transcreve são pertinentes para compreender que ela sabia que fizera mal e não é só a vergonha que sentia, que a fez estar calada, é o sentimento de culpa que a atormenta. O problema reside na construção do pensamento judaico-cristão da Europa desde a cristianização do Império Romano; a eles deve a Europa a sua maneira de ser e de estar.
Hanna tinha que estar arrependida e julgo que isso, para além da vergonha, deve ter pesado bastante para manter o silêncio!
d) Michael Berg foi apanhado de supresa e confrontado entre o bem e o mal. A atitude dele tem que ver com isso. Amou aquela mulher mas ela estava ligada ao genocídio e ao nazismo...No fundo ela era a representação do mal de que foi acusado todo o povo alemão por parte dos países vencedores.
Claro, ele também cometeu o crime por omissão, poderia ter ajudado Hanna. E não o fez porquê?
Porque ela era a representação de um período que era para esquecer, ela era, afinal, uma desconhecida e, o por último, o despeito de ter sido abandonado sem uma explicação.

ana disse...

Luís Barata,
A lente nunca é graduada a ponto de se ver com nitidez. Não partimos de uma tábua rasa, há sempre as sombras que são dadas pelas memórias da História que não deixam ver como era a realidade na verdade. Por isso, é que a História é bela, não tem verdades absolutas e permite vários olhares.

M,
A Inquisição tem que ser vista, na medida do possível, como algo que foi necessária ao Rei. O Príncipe e a Igreja estiveram em perfeita harmonia. Os segundos serviam os interesses do Estado: veicular a unificação do reino através da regulação dos comportamentos e do ensinamento do povo através da célula paroquial. Ninguém estava tão próximo do povo como a Igreja. Os nossos Reis nomeavam com a anuência do Papa os Inquisidores-Gerais, e nada mais explicito do que ter um Rei Inquisidor -Geral.

Jad,
Gostei imenso da sua abordagem. A neutralidade deve ser um ponto de partida mas não se consegue ser completamente neutro.
Alguma vez falou sem preconceitos bem do Salazar?
Michael agiu mal mas acho que já dei a minha opinião quanto a isso. A "culpa" um contínuo sentimento na História de longa duração.

Anónimo disse...

Ana,
E por ter sido «necessária ao rei» não a podemos julgar? Muitos a condenaram na época e acabaram em churrasco. E muitos emigraram. Com belos resultados para Portugal.

Desculpe eu responder a essa pergunta sobre Salazar que é para o Jad. Na verdade nunca falei bem de tal personagem. Não há nada de bom para dizer. Só mau. Só péssimo!
M.

ana disse...

É verdade M,
Podemos e devemos julgar. Apenas referi o que leu por causa de ter mencionado "limpar" a Inquisição. Tanto quanto me tenho vindo a aperceber não houve assim tantos casos na fogueira mas, mesmo o que houve, foi demais e indigno de ter sido feito.
Quanto a Salazar, devo dizer-lhe que a 1ª República não soube organizar-se e a instabilidade que criou só podia ter o curso que teve. Quando digo bem, foi no sentido de organizar as finanças que também se refere a um curto espaço de tempo. O meu pai foi perseguido na era de Salazar e isto diz tudo...

Miss Tolstoi disse...

A figura do prof. é baseada em Elie Wiesel? Não sabia.
O que fiquei a saber quando comprei o livro, que ando a ler, é que o autor é juiz do Tribunal Constitucional da Renânia-Vestefália.
E onde isto já vai. Novamente a questão do mito das Finanças de Salazar. Já aqui foi falado há tempos. Meteu dinheiro nos cofres e o povo a carpir.

ana disse...

Cara Miss Tolstoi,
Deve saber bem que durante a 1ª República o povo carpia e muito. Um dos problemas dos governantes era combater a insatisfação do povo que não viu na Repúlica as suas expectativas realizadas.
Conjuntura difícil, sim havia, nacional e internacional. Conseguiram resolver os problemas do país? Não, por isso, teve o desfecho que sabemos.
O meu pai fez campanha pelo Humberto Delgado, foi perseguido no tempo do Salazar. Ajudou muita gente a fugir, inclusivé deputados do PS, ia levá-los à fronteira, e foi do PS quando este se estabeleceu. (Já morreu e morreu socialista.)
Sinto à vontade para dizer que Salazar fez o que na altura era necessário e foi positivo, num curto espaço de tempo, deixando o povo a "carpir",como já estava habituado. Nunca defendi o Salazar mas tento julgar o passado com alguma neutralidade.

João Mattos e Silva disse...

Não posso deixar de meter a minha colherada, a propósito do filme que só vou ver para a semana que vem. Mas para dizer que os factos históricos- atenção, todos os factos históricos e não só os que achamos maus - devem ser julgados. É evidente que deverão ter um enfoque da época, mas mesmo assim julgados. Só assim foi possível que o mundo civilizado evoluísse, só assim é possível dar passos em frente em muitos aspectos, como é exemplo bastante os direitos humanos.Como é exemplo bastante a liberdade e a democracia. Como é exemplo bastante a solidariedade social.Como é evidente a Justiça independente do poder político.
Julgo que o historiador tem o dever ético de apresentar os factos, enquadrá-los e, quando muito, fazer o contraponto com a evolução que os movimentos políticos e sociais determinaram. Não distorcer os factos à luz dos seus conceitos. Infelizmente é o que todos fazem e por isso, não posso dizer que algum seja isento.
Quanto a Salazar. Porque nunca fui salazarista (muito menos salazarento) estou à vontade para dizer que, cara M., não foi só péssimo: teve méritos na recuperação das finanças públicas, por exemplo, que, cara Miss Tolstoi, não são um mito, são uma realidade. A que custo? Veja só o exemplo deste governo socialista. Já se sabe que é sempre o povo que paga a factura. Mas isso acho eu que só tive uns artiguitos de jornal cortados pela censura, coisa pouca coisa afinal e não tenho os louros de anti-fascista, sendo genéticamente e por formação contra todas as ditaduras.

Miss Tolstoi disse...

João Mattos e Silva,
Concordo consigo, à excepção do que se refere a Salazar.
Quanto ao presente não falo aqui no blogue.
Quando terminar de ler «O Leitor», volto aqui. Já estou a ameaçá-los com mais comentários.

ana disse...

Cara Miss Tolstoi,
É última vez que vou falar de Salazar até porque já estou cansada. Sou e serei uma lutadora das liberdades fundamentais: igualdade, fraternidade e LIBERDADE.
Passo a citar um historiador que ambas prezamos:
" O sucesso da sua política financeira grangeou-lhe imenso prestígio e converteu-o no «salvador» da Nação. O orçamento para 1928-29 previa um saldo positivo que pôde ser efectivado e era o primeiro desde havia quinze anos."

OLIVEIRA MARQUES, A.H. - História de Portugal, Lisboa: Palas Editores, 1976 (3ª edição), p. 341.

Luís Barata afinal tenho a 3ª edição, pensava por estar muito velhinha (manuseamento) que era a 1ª edição.

ana disse...

OLIVEIRA MARQUES, A.H. - História de Portugal, Lisboa: Palas Editores, 1976 (3ª edição), Vol.II, p. 341.

Jad disse...

Fui re-rever o filme (dado que é a terceira vez que o vejo) e pela primeira vez consegui não sentir o "soco no estômago".
De cada vez revejo algumas das minhas formas de analisar e de abordar a problemática retratada.
O filme é realmente um dos meus filmes!